Na manhã de 24 de agosto de 1954, o presidente Getúlio Vargas se suicidou com um tiro no coração em resposta aos ataques de seus opositores e da imprensa, especialmente a União Democrática Nacional (UDN) e Carlos Lacerda.
Os 19 dias transcorridos entre o atentado da Rua Tonelero (5 de agosto) e o suicídio de Vargas (24 de agosto) foram marcados por fortes pressões políticas. Grupos das Forças Armadas, principalmente ligados à Aeronáutica (a vítima fatal do atentado era um oficial da Aeronáutica) colocaram-se frontalmente contra o governo, enquanto no Parlamento, a oposição liderada pela UDN, demonstrava a cada dia sua decisão de afastar Vargas da presidência.
As investigações do atentado mostraram o envolvimento de funcionários do Palácio do Catete e logo se chegou ao nome de Gregório Fortunato, chefe da guarda pessoal do presidente. Nada mais faltava à oposição. Novas denúncias de que um dos filhos do presidente mantinha negócios escusos com o chefe da guarda abalam a já frágil sustentação política do governo.
Dois dias antes do trágico final, os militares exigiram a renúncia e, novamente, Vargas não a aceita, respondendo “daqui só saio morto”.
No dia 23 de agosto, começou a circular na esfera militar um documento assinado por alguns generais apoiando a decisão da Aeronáutica e da Marinha de exigir a renúncia do presidente. Sabedor da existência do documento, que ficou conhecido como Manifesto dos generais, mais uma vez Vargas declarou que não renunciaria.
Na noite do mesmo dia, Vargas reuniu seu ministério para avaliar a real situação, àquela altura, já muito grave. Foi aconselhado pelos ministros a se licenciar da presidência, com o que teria concordado. Getúlio subiu as escadas para ir ao seu apartamento. Despediu-se do ministro da Justiça Tancredo Neves, deu-lhe a caneta Parker 51 de ouro, e lhe diz: “Para o amigo certo das horas incertas”.
Na madrugada do dia 24, Getúlio foi informado que seu irmão, Benjamim Vargas, estava sendo convocado para depor na “República do Galeão”, nome dado à operação da Aeronáutica que se investira de funções policiais para apurar o atentado da Rua Tonelero. Fica sabendo também que a licença do cargo fora convertida em veto militar. O Palácio do Catete já estava protegido com trincheiras de sacos de areia. A possibilidade de uma guerra civil era considerada uma ameaça real.
Por volta das 8:30h Getúlio Vargas se suicida com tiro no coração. O impacto provocado pela notícia e a divulgação da carta-testamento foi intenso: manifestações populares de apoio a Vargas estouraram em todo o país.
Comoção popular pela morte de Vargas
Assim que a notícia do suicídio foi divulgada pelo Repórter Esso, o noticiário radiofônico mais popular da época, milhares de pessoas saíram às ruas para prestar o “último adeus” ao “pai dos pobres levando retratos de Getúlio e cartazes. Escolas liberaram os alunos, o comércio fechou e as fábricas desligaram as máquinas. As pessoas caminhavam tontas e chorosas pelas ruas.
Carlos Lacerda teve que fugir do país, com medo de uma perseguição popular.
“A bala que matou Getúlio atingiu também seus adversários. […] A multidão enfurecida queimou os caminhões de jornais da oposição, enfrentou a polícia, apedrejou a embaixada americana. O homem das ruas amava Vargas e para ele a Carta-Testamento não deixava dúvidas. Getúlio fora vítima mdos que combatiam suas qualidades, não os seus defeitos: os inimigos do trabalhismo e os opositores da nacionalização das riquezas do país. […] Com Getúlio o capitalismo pelo menos incorporava as massas. Com todo o empreguismo e favoritismo, o salário aumentava, havia a possibilidade de alguma barganha, de um lucro social conquistado pelo próprio povo: o esgoto, a bica, a estabilidade no emprego, o salário mínimo. Matando-se Getúlio neutralizou as vantagens políticas que seus adversários haviam acumulado.” (Cláudio Bojunga in Nosso Século, v. 3, São Paulo: Abril Cultural, 1980, p, 125.)
Enterro em São Borja, RS
Com grande comoção popular nas ruas, o corpo de Vargas foi levado para ser enterrado em São Borja, sua terra natal, no Rio Grande do Sul. A família de Getúlio recusou-se a aceitar que um avião da FAB transportasse seu corpo e também recusou as homenagens oficiais que o novo governo de Café Filho queria prestar ao ex-presidente falecido. Getúlio deixou duas notas de suicídio, uma manuscrita e outra datilografada, as quais receberam o nome de carta-testamento.
Uma versão da carta foi lida, de maneira emocionada, por João Goulart, no enterro de Getúlio em São Borja. Nesta versão, na qual está a frase “Saio da vida para entrar na história” é ainda alvo de discussões sobre sua autenticidade. O diplomata brasileiro Osvaldo Aranha, amigo e aliado de longa data de Getúlio, também fez um discurso emocionado: “Nós, os teus amigos, continuaremos, depois da tua morte, mais fiéis do que na vida: nós queremos o que tu sempre quiseste para este País. Queremos a ordem, a paz, o amor para os brasileiros!”
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