A expressão coup d’Etat surgiu no século XVII com Gabriel Naudé, em Considérations politiques sur le coup-d’état (1639), para definir a decisão de Catarina de Médici de eliminar os heguenotes (protestantes) na noite de São Bartolomeu (23 e 24 de agosto de 1572, em Paris), e também a proibição do imperador romano Tibério à sua cunhada de contrair núpcias para evitar o perigo de que os eventuais filhos dela pudessem disputar a sucessão imperial com os filhos do imperador.
Estes e outros exemplos de golpe de Estado mencionados por Naudé têm em comum serem um ato executado pelo soberano para reforçar o próprio poder. Esta decisão é geralmente tomada de surpresa para evitar reações por parte daqueles que deverão sofrer as consequências.
O conceito foi ganhando novos contornos com o advento dos regimes constitucionais. Passou a ser definido como todo movimento de subversão da ordem constitucional, toda derrubada de um regime político que viola a Constituição do Estado, por parte dos próprios detentores do poder político.
Neste sentido, foi um Golpe de Estado a tomada de poder por Napoleão Bonaparte no 18 Brumário, quando este, em 1799, assumiu o poder da França substituindo o Diretório por um consulado e logo por seu governo individual e ditatorial. Foi também um Golpe de Estado o que Luís Bonaparte realizou em 1851, quando deu um golpe na II República de que era presidente, conseguindo proclamar-se o novo imperador da França.
O que é golpe de Estado
É a derrubada ilegal de um governo constitucionalmente legítimo por uma facção política, militares ou um ditador. Pode ser uma ação violenta ou não, pode corresponder aos interesses da maioria ou de uma minoria. Caracteriza-se por uma ruptura institucional repentina, contrária à normalidade da lei e da ordem e submetendo o controle do Estado a pessoas que não haviam sido legalmente designadas.
O objetivo de todo golpe de Estado é tomar o poder, derrubando o governo em exercício. Ele instala uma outra forma de governo, em geral uma ditadura.
O Golpe de Estado pode ser acompanhado ou seguido de mobilização política ou social. Pode ser executado por um grupo militar ou pelas forças armadas como um todo. Num caso contrário, pode ser executado justamente por contar com a neutralidade e cumplicidade das forças armadas.
O que é autogolpe
É uma forma de golpe de Estado em que um chefe de Estado e/ou de governo, tendo chegado ao poder por meios legais, permanece no poder por meios ilegais, por ações próprias e/ou de seus apoiadores. O líder pode impedir o poder Legislativo, anular a Constituição ou suspender os tribunais para assumir poderes extraordinários não concedidos em circunstâncias normais.
Os golpes no Império Brasileiro
Havia apenas 14 meses que o Brasil era independente quando sofreu seu primeiro golpe político (na verdade, um autogolpe): a dissolução da Assembleia Constituinte por D. Pedro I, com o apoio dos militares (12/11/1823). O imperador mandou o Exército invadir a sede do Congresso, reunido em assembleia para redigir a primeira Constituição do país. Foi a chamada “Noite da Agonia” quando vários deputados foram presos, entre eles, José Bonifácio e seus irmãos Antônio e Martim Francisco.
Com a dissolução da Assembleia constituinte, Pedro I reuniu dez cidadãos de sua confiança que, a portas fechadas, redigiram uma nova Constituição, outorgada em 25 de março de 1824, que estabeleceu o Poder Moderador. A Constituição outorgada de 1824 nascia, assim, de cima para baixo, imposta pelo rei ao “povo”, isto é, aos brancos e mestiços livres que votavam e que, de algum modo, tinham participação na vida política.
Poucos anos depois, a abdicação de D. Pedro I, em 7 de abril de 1831, abriu o período das Regências, um dos mais agitados da história política do país. “Entre as classes e os grupos dominantes, não havia consenso sobre qual arranjo institucional mais conveniente para seus interesses. Mas ainda, não havia clareza sobre o papel do Estado como organizador dos interesses gerais dominantes, tendo para isso de sacrificar em certas circunstâncias interesses específicos de um determinado setor social” (FAUSTO, 1995).
As rebeliões e tensões políticas do período regencial levaram um golpe parlamentar, dado pelos liberais que, naquele momento, estavam na oposição: o Golpe da Maioridade (23/7/1840). O golpeado foi o conservador Pedro de Araújo Lima, senhor de engenho de Pernambuco que, três meses antes, havia sido eleito regente. Os golpistas declararam D. Pedro II (então com 14 anos) maior de idade e, com essa medida, transferiram o poder para o imperador adolescente.
Com o apoio declarado do próprio imperador, os liberais conseguiram que a Assembleia Geral aprovasse a maioridade a 23 de julho de 1840 (veja proclamação abaixo). Os liberais tiraram proveito imediato do golpe: já no dia 24 de julho de 1840, D. Pedro II formava um novo ministério com os liberais que, com isso, tiraram os conservadores do poder (por pouco tempo, porém).
Proclamação da Assembleia Geral ao povo
Brasileiros!
A Assembleia Geral Legislativa d Brasil, reconhecendo o feliz desenvolvimento intelectual de S.M.I. o Senhor D. Pedro II, com que a Divina Providência favoreceu o Império de Santa Cruz; reconhecendo igualmente os males inerentes a governos excepcionais, e presenciando o desejo unânime do podo desta capital; convencida de que com este desejo está de acordo o de todo o Império, para conferir-se ao mesmo Augusto Senhor o exercício dos poderes que, pela Constituição lhe competem, houve por bem, por tão poderosos motivos, declará-lo em maioridade, para o efeito de entrar imediatamente no pleno exercício desses poderes, como Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil.
Brasileiros! Estão convertidas em realidades as esperanças da Nação; uma nova era apontou; seja ela de união e prosperidade. Sejamos nós dignos de tão grandioso benefício.
Paço da Assembleia Geral, 23 de julho de 1840.
Durante os primeiros anos do Segundo Reinado, as elites imperiais foram desenhando um acordo político para formalizar as regras do poder de maneira a atender os interesses de todos os grupos. A fórmula resultou em um sistema de governo assemelhado ao parlamentar que ganhou o nome de Parlamentarismo às Avessas. “Tratava-se de um sistema flexível que permitia o rodízio dos dois principais partidos no governo. Para quem estivesse na oposição, havia sempre a esperança de ser chamado a governar. Assim, o recurso às armas se tornou desnecessário.” (FAUSTO, 1995.)
A República golpeada pelos militares
Golpe de 15/11/1889
O 15 de Novembro foi um golpe militar que destituiu o chefe de Estado, o imperador D. Pedro II (ironicamente, ele assumiu o poder por meio de um golpe, em 1840, e dele foi retirado por outro golpe).
Não foi a primeira vez que se tentou implantar a República no Brasil, mas foi único golpe bem-sucedido. Outras tentativas republicanas foram: a Inconfidência Mineira (1789), a Revolução Pernambucana (1817), a Confederação do Equador (1824), a Guerra dos Farrapos que, em 1839, proclamou a República Rio-Grandense (RS) e a República Juliana (SC)
A República nasceu de um Golpe de Estado executado por uma facção do Exército, um motim de soldados, como avalia José Murilo de Carvalho. As forças armadas não estavam unidas, das altas patentes do Exército apenas o marechal Deodoro da Fonseca esteve, e quase não houve participação da Marinha.
Apesar do apoio de civis republicanos descontentes com a monarquia, estes estiveram ausentes do golpe em si. Seu papel foi importante para a organização do novo regime. A falta de coesão entre as forças republicanas, que tinham interesses e projetos diferentes de República, e a reação de monarquistas levaram aos dez anos de conturbação política que se seguiram ao 15 de novembro.
Golpe de 3/11/1891
O marechal Deodoro da Fonseca, primeiro presidente do Brasil, entra em confronto com o poder Legislativo, declara estado de sítio e fecha o Congresso Nacional (3/11/1891). Manda o Exército cercar a Câmara e o Senado, prendendo opositores e alguns antigos aliados como Quintino Bocaiuva. Ficaram suspensas todas as disposições da nova constituição republicana relativas aos direitos individuais e políticos. A partir daquele momento, qualquer pessoa poderia ser presa sem direito a habeas corpus ou defesa prévia.
No dia 23/11, a Marinha se levanta contra esse autogolpe e ameaça bombardear o Rio de Janeiro caso Deodoro não renunciasse. O marechal Deodoro, então, cedeu às pressões e renunciou ao cargo de presidente da República, entregando o poder ao vice-presidente, Floriano Peixoto.
Golpe de 23/11/1891 – o governo ilegítimo de Floriano Peixoto
Com a renúncia do marechal Deodoro assume o vice presidente, marechal Floriano Peixoto, que deveria convocar novas eleições. Mas ele não o fez e ficou no poder até o término do mandato de Deodoro.
Militares da Marinha contestaram a legitimidade do governo de Floriano e exigiram a convocação de novas eleições presidenciais (Manifesto dos 13 Generais). Em represália, Floriano afastou-os da Marinha e mandou prender alguns deles. Os militares responderam com a Segunda Revolta da Armada (setembro de 1893) que Floriano reprimiu com tamanha violência e crueldade (mandou passar a fio da espada os opositores) que ficou conhecido como “marechal de ferro”.
Quando seu mandato chegou ao fim, recusou-se a passar a faixa ao seu sucessor, o civil Prudente de Morais, o primeiro presidente eleito por voto direto. Contrariado com a transferência do poder para um civil, Floriano Peixoto não compareceu à cerimônia de transmissão do cargo.
As tentativas golpistas do Tenentismo (década de 1920)
O Tenentismo, movimento político-militar surgiu nos quartéis espalhados em todo território na década de 1920. Foi protagonizado por jovens oficiais de baixa e média patente do Exército insatisfeitos com o governo da República Oligárquica. O movimento pretendeu derrubar pelas armas, três governos e os sistemas políticos que os sustentavam. Defendia reformas na estrutura de pode como o fim do voto aberto, a instituição do voto secreto e do ensino público obrigatório.
Acima de tudo, os ‘tenentistas’ tinham a convicção da importância dos militares na “moralização da Republica”, isto é, a crença de seu papel transformador nos costumes políticos do país – ideia que se manteve no meio militar muito tempo depois de desaparecido o movimento.
Os movimentos tenentistas foram:
- Revolta dos 18 do Forte de Copacabana (4-6 de julho de 1922, RJ): pretendia derrubara o governo de Epitácio Pessoa e não deixar assumir o presidente eleito Artur Bernardes.
- Revolta Paulista de 1924 (de julho a setembro de 1924, SP): pretendia derrubar o governo de Artur Bernardes.
- Comuna de Manaus de 1924 (julho-agosto de 1925, AM): chegou a controlar o poder do Amazonas por mais de um mês.
- Coluna Prestes (de 1925 a 1927): percorreu o interior do país, do Rio Grande do Sul ao sertão do Nordeste tentando sublevar populações locais contra os governos oligárquicos.
Golpe de 24/10/1930 – a “Revolução de 1930”
O golpeado foi o presidente Washington Luís, deposto da presidência em 24 de outubro e preso no Forte de Copacabana (ele partiu para o exílio, pouco tempo depois, em 20 de novembro). Também foi golpeado Júlio Prestes, recém-eleito presidente e que assumiria o poder em 15 de novembro. Ele pediu asilo ao Consulado britânico e viveu no exilio até 1934.
Uma junta militar (dois generais e um almirante) assumiu o governo, fechou o Congresso e impediu a posse do recém eleito presidente Júlio Prestes, que assumiria o poder em 15 de novembro.
A junta convidou Getúlio Vargas para tomar posse como presidente da República, o que aconteceu em 3 de novembrode 1930, inaugurando o Governo Provisório de Vargas.
Golpe de 10/11/1937 – a ditadura do Estado Novo
Foi um autogolpe, executado pelo próprio chefe de Estado, Getúlio Vargas, com apoio de militares. O pretexto foi a descoberta do Plano Cohen – um plano para derrubar o governo e implantar o comunismo no país.
O tal plano era falso e a farsa foi denunciada alguns anos depois. Havia sido encomendado pelo líder integralista Plínio Salgado a um jovem capitão do Exército, Olímpio Mourão Filho. Serviria como exercício contra uma hipotética insurreição comunista. Entretanto, uma cópia chegou à cúpula das Forças Armadas e foi entregue a Getúlio Vargas.
Com apoio dos militares, Vargas suspendeu as eleições, fechou o Congresso Nacional, anulou a Constituição de 1934 e outorgou uma nova constituição que lhe conferia plenos poderes. Estava instalada a ditadura do Estado Novo.
Olímpio Mourão Filho nunca foi punido pela farsa que criou e pelo silêncio cúmplice, ao contrário, continuou a carreira militar chegando a coronel em 1948 e general-de-brigada em 1956.
Golpe de 29/10/1945 – deposição de Vargas
Membros da cúpula das Forças Armadas e ministros do Estado Novo, como Goes Monteiro, Cordeiro de Farias, Newton de Andrade Cavalcanti, além do próprio candidato presidencial, Eurico Gaspar Dutra forçaram o presidente Getúlio Vargas a renunciar, pondo fim à ditadura do Estado Novo.
A queda de Vargas ocorreu em um contexto político global influenciado pela derrota do nazi-fascimo na Segunda Guerra Mundial e pelos movimentos a favor da abertura política no Brasil. Em 1945, com a consumação da derrota do Eixo, o descontentamento com o autoritarismo do regime varguista cresceu.
Consciente da nova situação política, Vargas tomou a dianteira no processo de redemocratização ao editar o Ato Adicional número 9, prevendo a convocação de eleições gerais, com sufrágio universal. Além disso, foi concedido o direito de organização de partidos políticos, o que havia sido extinto pela Constituição de 1937.
Entre os partidos formados, surgiu o Partido Trabalhista Brasileiro, que passou a articular a permanência de Vargas na presidência, o que deu origem a campanha nacional chamada “Queremismo”, cujo lema era “Queremos Getúlio”.
O Queremismo preocupou setores da elite brasileira e das Forças Armadas que viram nesse movimento uma manobra de Vargas para se perpetuar no poder. No final de outubro, o general Góis Monteiro, ministro da Guerra, iniciou mobilizações de tropas no Distrito Federal, que culminariam com a deposição do presidente em 29 de outubro de 1945. Para evitar derramamento de sangue, Gaspar Dutra propôs a Vargas que assinasse de maneira oficial um documento de renúncia. Assim, o presidente deposto conseguiu deixar o cargo sem punição e retornou a sua cidade natal, São Borja (RS).
Assumiu a presidência da República o ministro José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal. Este manteve as eleições marcadas para 2 de dezembro de 1945. Venceu o pleito Eurico Gaspar Dutra, apoiado por Get´lui Vargas.
Embora deposto, Vargas não foi mandado ao exílio, não teve seus direitos políticos cassados nem teve que responder a qualquer processo judicial por atos cometidos no exercício da presidência. Expulso do Palácio do Catete, RJ, Vargas refugiou-se em sua estância em São Borja, RS, numa espécie de “auto-exílio” interno.
Fevereiro a agosto/1954 – militares contra Getúlio Vargas
O ano de 1954 foi marcado pelo agravamento da crise política que assolava o Brasil desde a posse de Getúlio Vargas, em 1951. O primeiro ponto de tensão foi a proposta de João Goulart, ministro do Trabalho, no reajuste de 100% sobre o salário mínimo o que motivou a manifestação da ala conservadora do Exército por meio do Manifesto dos Coronéis (8/2/1954).
O documento, também conhecido como Memorial dos Coronéis era assinado por 42 coronéis e 39 tenentes-coronéis e dirigido à alta hierarquia militar, em protesto contra os limitados recursos destinados ao Exército incluindo os soldos.
A pressão foi tamanha, que Getúlio demitiu o ministro do Trabalho, mas, em maio, concedeu o aumento do salário mínimo conforme proposto por Goulart. Isso gerou revolta entre o empresariado brasileiro que aderiu à campanha antigetulista da ala conservadora das Forças Armadas e da UDN (União Democrática Nacional, partido antigetulista).
Em 5 de agosto, Carlos Lacerda, líder da UDN, sofreu um atentado onde perdeu a vida o major da Aeronáutica Rubens Vaz. As investigações preliminares realizadas no Inquérito Policial Militar apuram a responsabilidade de Gregório Fortunato, chefe da segurança pessoal do presidente Vargas. A Aeronáutica se rebela contra o presidente, acusando-o de ter sido o mandante do atentado que vitimou o militar Rubens Vaz, ao passo que a UDN intensificava a campanha pela renúncia ou afastamento de Vargas.
A Marinha e a Aeronáutica entraram em estado de alerta na Capital Federal. Militares do Exército assinaram o Manifesto dos Generais (22/8/1954) exigindo a renúncia de Vargas. Na manhã de 24 de agosto, Getúlio se suicida.
Golpe de 11/11/1955 – o duplo golpe do marechal Lott
A Novembrada, como foi chamada, foi um contragolpe ou golpe preventivo do marechal Henrique Teixeira Lott em defesa da posse de Juscelino Kubitschek e João Goulart, presidente e vice-presidente eleitos em 3 de outubro de 1955.
A vitória desses candidatos desagradou políticos da UND (União Democrática Nacional), liderada por Carlos Lacerda, e uma parcela das Forças Armadas que viam em João Goulart o retorno da política varguista.
Lacerda procurou obter a impugnação do resultado das eleições, sob o argumento de que Juscelino não teria sido escolhido pela maioria do eleitorado (ele obteve 35,68% dos votos).
Na presidência, Café Filho mostrava-se simpático aos argumentos de Lacerda e defendidas pela UDN no Congresso. Todavia, o ministro da Guerra, general Henrique Teixeira Lott determinava que a Constituição deveria ser fielmente respeitada e que, se fosse preciso, o Exército daria todo o suporte necessário para garantir a posse dos eleitos.
Nesse ínterim, Café Filho foi internado por problemas de saúde, licenciando-se e passando suas funções ao presidente da Câmara, Carlos Luz, em 8/11/1955, que também era contrário à posse de Juscelino e de Jango.
Tomava corpo uma articulação para afastar o general Lott do Ministério da Guerra, retirando assim o último obstáculo à adesão do Exército ao movimento para impedir a posse de Juscelino e de Jango.
Na madrugada do dia 11/11, com apoio dos generais Odílio Denys e Olympio Falconière, o general Lott determinou o cerco do Palácio do Catete, sede do governo federal no Rio de Janeiro.
Ao perceber a movimentação das tropas, Carlos Luz, alguns ministros e Carlos Lacerda embarcam no Cruzador Tamandaré. Tiros foram disparados contra o cruzador a partir dos fortes do exército no Rio de Janeiro.
No mesmo momento, o general Lott encaminhou ao presidente do Senado Nereu Ramos, requerimento para que se votasse o impeachment de Carlos Luz. Em tumultuada sessão legislativa, o impeachment foi aprovado, por 185 votos a favor e 72 contrários entre os deputados federais e 43 contra 8 entre os senadores, em regime de urgência, ainda na manhã do dia 11/11.
Dez dias depois, com Nereu Ramos na presidência da República, Café Filho anunciou que iria reassumir o cargo de presidente, após ter recebido alta médica. Sabendo de sua posição contrária à posse dos eleitos, o general Lott tomou duas decisões: ordenou que tropas do Exército mantivessem Café Filho incomunicável em seu apartamento e enviou ao Congresso pedido do impeachment contra Café Filho. O impeachment foi aprovado no mesmo dia (21/11) por 179 votos a 94, entre deputados, e por 35 votos contra 16, entre senadores.
No dia 24 de novembro, Nereu Ramos obteve a aprovação do Congresso para decretar estado de sítio, que durou até a posse dos candidatos eleitos. Finalmente, em 31 de janeiro de 1956, realizou-se a cerimônia de posse de Juscelino Kubitschek e de João Goulart.
Golpe de 25/8/1961 e a saída do Parlamentarismo
Com a renúncia do presidente Jânio Quadros (24/8/1961), estando o vice-presidente João Goulart em visita oficial à China, a presidência da República foi assumida de direito por Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados. Isso, porém, era só aparência de legalidade, pois o poder de fato passou a ser exercido pelos ministros militares de Jânio Quadros que constituíram uma junta militar encabeçada pelo marechal Odílio Denys (exército), com o apoio do brigadeiro-do-ar Gabriel Grün Moss (aeronáutica) e do almirante Sílvio de Azevedo Heck (marinha).
Este governo durou treze dias ( de 25/8 a 7/9). Os três militares tentaram impedir, sem sucesso, a posse de João Goulart, abrindo-se uma grave crise político-militar no país. A solução para o impasse foi a aprovação de uma emenda à Constituição de 1946 instaurando o parlamentarismo.
João Goulart assumiu a presidência como chefe de Estado, isto é, representante da nação, mas sem o poder de governar. O chefe de governo era o primeiro-ministro. Em pouco menos de um ano, sucederam-se três primeiros-ministros: Tancredo Neves, Brochado da Rocha e Hermes Lima.
Foram 504 dias de regime parlamentarista (de 8/9/1961 a 24/1/1963). Com apoio nas bases populares e sindicalistas, Goulart conseguiu antecipar o plebiscito para janeiro de 1963 e reverteu facilmente o sistema para presidencialismo, recuperando a chefia de governo.
Golpe de 1964 – os militares finalmente no poder
O golpe civil-militar de 1964 (31/3 e 1º/4) foi preparado com antecedência e planejamento. Um processo que envolveu a destruição da legitimidade do governo junto ao povo, com boicotes e campanhas negativas realizadas especialmente por meio da imprensa (jornais O Globo, Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Diário de Notícias), a cooptação de aliados e lideranças políticas e sociais, o apoio da Igreja e do empresariado e, até mesmo o apoio militar e logístico norte-americano (a chamada Operação Brother Sam)
O golpe foi executado em 31 de março de 1964 pelo general Olympio Mourão Filho (o mesmo que criou o Plano Cohen, de 1937) com apoio do governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto. O golpeado foi o presidente João Goulart, democraticamente eleito como vice presidente e que assumiu a presidência com a renúncia de Jânio Quadros. No dia 2 de abril, numa sessão tumultuada do Congresso, Moura Andrade, presidente do Senado, declarou vaga a presidência da República (apesar de João Goulart estar no país).
Alegando que o presidente havia fugido do Brasil, Moura Andrade empossou o deputado Ranieri Mazzili, presidente da Câmara, no cargo maior do país. Em seguida mandou desligar os microfones e as luzes rapidamente sob protestos de Tancredo Neves.
Contudo, quem passou a exercer o poder de fato, foi uma junta militar constituída pelos ministros militares: Artur da Costa e Silva (Guerra), Augusto Rademaker Grünewald (Marinha) e Francisco de Assis Correia de Melo (Aeronáutica).
João Goulart, apesar de contar com o apoio do III Exército, comandado pelo general Ladário Teles, se recusou a resistir o que poderia desencadear uma guerra civil. Optou por ir embora do Brasil exilando-se no Uruguai. O golpe de 1964 levou o país a uma ditadura que durou vinte e um anos.
Fonte
- BARBÉ, Carlos. Golpe de Estado. In: BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola & PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília: UnB, São Paulo: Imprensa Oficial, 2000.
- CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados. São Paulo: Companhia das Letras., 1987.
- FERREIRA, Mário & NUMERIANO, Roberto. O que é golpe de Estado. São Paulo: Brasiliense, 1993.
- LUTTWAK, Edward. Golpe de Estado: um manual prático. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
- SILVA, Kalina Vanderlei & SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. São Pauloo: Contexto, 2005.
- FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp /FDE, 1995.
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Parabéns pelo belíssimo texto professora!
Obrigada Marcelo!
Professora, uma dúvida: Se passar por todo o processo legítimo de cassação, ainda assim é golpe ou é impeachment?
Vc está se referindo ao impeachment. No meu entender, seria um “golpe branco” se fosse feita uma alteração na Constituição e da Lei de Impeachment com o objetivo de mudar o resultado final, seja para condenar ou absolver a presidente. Também se configuraria um golpe se não fosse dado à presidente o direito de defesa previsto, ou se ocorresse uma ação armada ou anticonstitucional como, por exemplo, a presidente ser presa, o Congresso fechado etc. Mas não sou jurista e, certamente, um jurista apontaria outros elementos que poderiam configurar um golpe.
Obrigada pelo retorno.
muito bom
pra vc, esse ano de 2016, 2017, pode se assemelhar com a revoluçao francesa??? onde os ricos se prevalece dos mais pobres, tirando seus direitos,,,e outra, sobre partido, nunca tive preferencia por isso,mas nao tava muito contenet com PT, mas hoje ja tenho minha duvidas sobre o partido q ta hoje (PMDB), pois lendo algumas historias ví q o PT tambem nasceu de uma luta popular e social por igualdade, apesar de hoje o foco nao ser mais esse, agora a briga por poder, DIREITA xESQUERDA,qual a origem de direita e esquerda? pois sei q isso vem lá de traz…
Ser esquerda, é ser contrário as práticas capitalista que tira da saciedade os direitos sociais. igualdade, segurança, educação, saúde, moradia, trabalho, comida na mesa, participar dos meios de vida para todos.
Boa noite professora… Com a distância necessária e com os fatos que hoje se apresentam, creio que podemos avaliar, por base do texto apresentado, que os caracteres do “golpe” em 2016, se tornam evidentes, já que toda a estrutura do poder foi usada em favor das elites que estavam em busca de um “golpe branco” para legitimar seu candidato ao poder.
Assim os boicotes na câmara promovido pelo então deputado E. Cunha, os pagamentos de propinas para forçar um resultado, tanto na Câmara como no senado, dão base para que este conceito não se esvazie, não acha?!
Concordo Ciro. O golpe de 2016 ficou mais claro nesse ano. As máscaras caíram. E continuarão caindo em 2018, ano de eleições.
Verdade Ciro Lins. Especialmente se considerarmos a análise feita no texto sobre os antecedentes do golpe de 1964: “O golpe de 1964 vinha sendo preparado com antecedência e planejamento. Um processo que envolveu a destruição da legitimidade do governo junto ao povo, com boicotes e campanhas negativas realizadas especialmente por meio da imprensa (jornais O Globo, Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Diário de Notícias), a cooptação de aliados e lideranças políticas e sociais, o apoio da Igreja e do empresariado e, até mesmo o apoio militar e logístico norte-americano (a chamada Operação Brother Sam)”. Isso não lembra o… Leia mais »
Mas então podemos dizer que tudo que ocorre no pleito político seja algum tipo de golpe, já que sempre há alianças, propinas, apoio de lideranças sociais e de bancadas específicas, mídias etc. Todas aprovações de leis, campanhas políticas, eleições são golpes aplicados diariamente na população.