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Fim do bando de Lampião, o Rei do Cangaço

28 de julho de 1938

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Em 28 de julho de 1938, o bando de Lampião foi cercado na Fazenda Angico, no sertão de Sergipe. Uma tropa de 48 policiais de Alagoas, comandada pelo tenente João Bezerra e munida com quatro metralhadoras Hotkiss, metralhou os 34 cangaceiros presentes.

Onze morreram ali mesmo, entre eles Lampião e sua companheira, Maria Bonita. Alguns cangaceiros conseguiram escapar. Todos os mortos tiveram suas cabeças cortadas. Maria foi degolada viva.

O fim dramático do bando de Lampião repercutiu negativamente entre outros cangaceiros e, a partir de então, muitos bandos se desfizeram e alguns se entregaram.

O cangaço: um fenômeno social

O cangaço foi uma forma de banditismo peculiar no nordeste brasileiro, vivida por sertanejos pobres que encontravam nessa prática proteção contra a exploração e a fome, ainda que sendo um modo de vida marginal e criminoso. Muitos homens e mulheres ingressaram no cangaço, vagando pelo sertão em busca de dinheiro, comida, armas e munição num espírito de vingança contra o domínio dos latifundiários e o governo.

Os cangaceiros tinham, muitas vezes, apoio da população mais pobre que lhes fornecia abrigo e informações que os ajudavam a escapar das forças policiais, conhecidas como “volantes”.

O cangaço ganhou força em resultado das secas mortais de 1877-1878 e atingiu o seu clímax na década de 1920. O primeiro bando de cangaceiros que se tem conhecimento foi o de Jesuíno Alves de Melo Calado, apelidado “Jesuíno Brilhante” que, entre 1871 e 1879, agiu na região entre os estados do Rio Grande do Norte e a Paraíba, até ser morto em uma emboscada.

Mapa cangaço

Mapa de atuação do cangaço no interior do Nordeste.

Lampião, o Rei do Cangaço

O pernambucano Virgulino Ferreira da Silva, vulgo Lampião (1898-1938) foi o mais bem-sucedido líder cangaceiro da história o que lhe valeu o título de Rei do Cangaço.  Até os 20 anos de idade trabalhou como artesão de couro. Era alfabetizado e usava óculos para leitura, características bastante incomuns para a região sertaneja e pobre onde ele morava. Uma das versões a respeito de seu apelido é que sua capacidade de atirar seguidamente, iluminando a noite com seus tiros, fez com que recebesse o apelido de lampião.

Lampião entrou para o cangaço junto com mais dois irmãos para vingar a morte do pai em confronto com a polícia. Em 1922, tornou-se líder de bando e, desde então, praticamente todos os estados do nordeste. Atacou fazendas e cidades além de praticar roubo de gado, saques, sequestros, assassinatos, torturas, mutilações e estupros. Sua passagem causava terror e indignação nos moradores.

Apesar disso, Lampião e seu bando eram frequentemente protegidos por coiteiros:  fazendeiros, pequenos sitiantes ou mesmo autoridades locais que ofereciam abrigo e alimentos aos bandos por um curto espaço de tempo nos limites de suas terras, facilitando o deslocamento dos cangaceiros pelo Nordeste e sua fuga das forças volantes do Estado.

Cartaz Lampião

Cartaz oferecendo prêmio em dinheiro para quem capturasse Lampião, Bahia, c.1930.

Em 1926, por ocasião do avanço da Coluna Prestes (1925-1927) na cidade de Juazeiro do Norte, Lampião foi cooptado pelo governo do Ceará para enfrentar e derrotar os homens da coluna. Foi-lhe, então, prometido a patente de capitão da Guarda Nacional, título que Lampião acabou incorporando.

Em 1929, conheceu, no sertão da Bahia, a jovem Maria Gomes de Oliveira, de 18 anos de idade, chamada desde a infância de Maria de Déa, com quem se casou. Posteriormente, após sua morte, ela viria a ser conhecida como Maria Bonita. Foi a primeira mulher a ingressar no cangaço.

Em 1936, Lampião e seu cotidiano na caatinga foi fotografado e filmado pelo fotógrafo libanês-brasileiro Benjamin Abrahão Botto.

Benjamin Abrahão e o bando de Lampião

O fotógrafo Benjamin Abrahão cumprimenta Lampião, em foto tirada pelo cangaceiro Juriti. Da esquerda para a direita: Vila Nova, não identificado, Luís Pedro, Benjamin Abrahão (à frente), Amoroso, Lampião, Cacheado (ao fundo), Maria Bonita, não identificado, Quinta-Feira.

O governo Vargas ordena o fim de Lampião e seu bando

Segundo o historiador Frederico Pernambucano de Mello, “Lampião vivia fora da lei, mas mantinha excelente relacionamento com os poderosos. Era protegido por coronéis e políticos. O governador de Sergipe, Eronildes Ferreira de Carvalho, tinha amizade com Lampião e lhe fornecia armamento e munição”.

A instalação do Estado Novo, em 1937, pôs fim a essa promiscuidade entre poder público e banditismo. Uma das bandeiras da ditadura era a modernização do país. Nesse novo Brasil, que deixaria de ser agrário para se tornar urbano e industrial, o cangaço era uma mancha a ser apagada.

Ricardo Westin aponta que o documentário mudo de Benjamin Abrahão Botto foi o pretexto final para por fim ao cangaço. O documentário mostrava ao país a rotina do bando de Lampião na caatinga: cangaceiros alegres, bem vestidos e com joias. Nem pareciam fugitivos. Sentindo-se afrontado, Vargas ordenou aos governadores do Nordeste que parassem de fazer vista grossa e aniquilassem o rei do cangaço. Assim se fez.

Jornal A Noite noticia a degola de Lampião, 28 de Julho de 1938.

A morte e a degola de Lampião e seu bando

No dia 27 de julho de 1938, Lampião e seus homens acamparam na fazenda Angicos, no sertão de Sergipe, esconderijo tido por Lampião como o de maior segurança. Era noite, chovia muito e todos dormiam em suas barracas. Os policiais comandados pelo tenente João Bezerra e sargento Aniceto Rodrigues da Silva chegaram silenciosamente e sequer foram percebidos pelos cães.

O ataque ocorreu ao amanhecer do dia seguinte. O bando foi pego totalmente desprevenido sem chance de se defender dos tiros das metralhadoras disparados durante cerca de vinte minutos.  Dos 34 cangaceiros presentes, onze morreram ali mesmo. Lampião foi um dos primeiros a morrer. Logo em seguida, Maria Bonita.

Os policiais degolaram os mortos e apreenderam todo o dinheiro, o ouro e as joias. As cabeças foram salgadas e colocadas em latas de querosene contendo aguardente e cal. Os corpos mutilados e ensanguentados foram deixados a céu aberto, atraindo urubus.

Na cidade de Piranhas, Alagoas, as cabeças foram arrumadas na escadaria da Prefeitura, junto com armas e apetrechos dos cangaceiros, e fotografadas. Seguiram depois para diversas cidades do Nordeste onde foram expostas atraindo muita gente.

As cabeças foram levadas para Salvador, Bahia, permanecendo primeiro na Faculdade de Odontologia da UFBA, e depois Museu Antropológico localizado no prédio do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, em Salvador. As cabeças de Lampião, Maria Bonita e demais integrantes do bando só foram sepultadas em fevereiro de 1969.

Cabeças dos cangaceiros

As cabeças dos cangaceiros incluindo Lampião (no primeiro degrau) e Maria Bonita (ao centro, no segundo degrau), fotografadas em Piranhas, Alagoas, 1938.

O espetáculo mórbido teve efeito: bandidos de outros grupos correram para se entregar, de olho na anistia prometida a quem delatasse companheiros. O último cangaceiro conhecido, Corisco (Cristino Gomes da Silva Cleto), foi derrubado em 25 de maio 1940, em Barra do Mendes, na Bahia.

Fonte

  • PAIVA, Melquíades Pinto. Ecologia do cangaço. Rio de Janeiro: Interciência, 2004
  • OLIVIERI, Antonio Carlos. O Cangaço. São Paulo: Ática, 1995.
  • DÓRIA, Carlos Alberto. O Cangaço. São Paulo: Brasiliense, 1982.
  • ARAÚJO, B. Goytacazes. A Instabilidade Política na Primeira República Brasileira. Juiz de Fora: Ibérica. 2009.
  • CHANDLER, Billy Jaynes. Lampião: O Rei dos Cangaceiros. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.
  • JASMIN, Élise. Cangaceiros. São Paulo: Terceiro Nome, 2006.
  • QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. História do Cangaço. Rio de Janeiro: Global, 1986.
  • WESTIN, Ricardo. Combate a Lampião quase entrou na Constituição de 34. Agência Senado, 02.jul. 2018.
  • MELLO, Frederico Pernambucano de. Quem foi Lampião. Recife: Stahli, 1993.

 

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