Em 7 de junho de 1494, na pequena cidade de Tordesilhas, ao norte da Espanha, foi assinada, entre Portugal e Castela (Espanha) a Capitulação de la partición del Mar Oceano mais conhecida como Tratado de Tordesilhas. O tratado dividia “as terras descobertas e por descobrir” procurando, assim, resolver a disputa entre as duas nações com relação as terras descobertas por Cristóvão Colombo em 1492.
Ficou definida como linha divisória o meridiano 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão no arquipélago de Cabo Verde ficando para a Espanha as terras a oeste dessa linha, e para Portugal, as terras a leste. O tratado alterou consideravelmente o estabelecido pela bula Inter coetera, de 1493, que demarcava uma linha divisória a a 100 léguas a oeste de Cabo Verde.
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Contexto histórico
Portugal desde a conquista de Ceuta, em 1415, realizava a exploração sistemática da costa africana tendo atingido, em 1488, o cabo da Boa Esperança (ex-Cabo das Tormentas) no extremo sul no continente africano. Pouco antes, em 1482-1483, Diogo Cão buscara uma passagem para o Índico adentrando o rio Zaire – expedição que marcou a presença portuguesa no Congo. Foi nesse mesmo ano que o genovês Cristovão Colombo ofereceu a D. João II, rei de Portugal, seu projeto de navegar para as Índias pelo Ocidente – o que foi recusado uma vez que o rei estava convencido de estar no caminho correto contornando o cabo sul-africano.
As conquistas dos diversos pontos da costa africana estavam legitimadas por uma série de bulas papais que autorizavam o rei português a conquistar e submeter os infiéis e pagãos, apoderar-se de seus bens e transferir seus territórios para o domínio de Portugal. Concediam, ainda, à Ordem de Cristo, dirigida pelo infante D. Henrique, a jurisdição espiritual sobre todas as regiões conquistadas pelos portugueses, no presente ou no futuro, “dos cabos Bojador e Não, por via da Guiné e mais além, para o sul, até as Índias”.
Desde a década de 1470, a Espanha vinha questionando os direitos de Portugal sobre a costa africana e as ilhas atlânticas. Em 1480, ambos países assinaram o Tratado de Alcáçovas-Toledo pelo qual era reconhecido o controle de Portugal sobre suas possessões da Guiné, Costa da Mina, Madeira, Açores, ilha das Flores e Cabo Verde. Castela, por sua vez, tinha reconhecida sua soberania sobre as Canárias. O Tratado regulamentava, também, as áreas de influência e de expansão de ambas as coroas no norte da África e a posse de terras ainda não descobertas – cláusula inédita, então, em tratados desse tipo.
Chegada à América reacende as tensões
Com a chegada de Colombo à América, em 1492, as relações entre os Estados ibéricos, voltaram a se complicar. Ao fazer escala em Lisboa, em 1493, depois do regresso da célebre viagem, Colombo foi advertido de que as terras situadas ao sul das Canárias pertenciam a Portugal, de acordo com o Tratado de Alcáçovas-Toledo.
D. João II enviou uma embaixada à Espanha e mandou preparar uma esquadra para tomar posse das novas terras. Os Reis Católicos buscaram então, apoio papal para a legitimação de seus novos domínios. O papa Alexandre VI, espanhol, estabeleceu, então, a bula Inter Coetera, de 1493. Mas Portugal reagiu discordando do limite de 100 léguas.
Os termos da bula eram desvantajosos para Portugal, que além de perder as novas colônias africanas e ilhas do Atlântico, ficava limitado na expansão para a África, pois a linha imaginária traçada pela ordem do papa passava a apenas 420 quilômetros a oeste da ilha de Cabo Verde. Para navegar até as novas terras, os navegadores portugueses precisavam de ventos favoráveis o que os obrigava fazer grandes voltas. Porém, a linha determinada pela bula impedia que os portugueses navegassem sem que invadissem território castelhano.
Uma intensa atividade diplomática tentou negociar uma solução evitando que os países fossem à guerra. Em meio às discussões, em setembro de 1493, Colombo partiu para sua segunda viagem, com a promessa trazer informações que ajudassem as negociações.
Seguiu-se, então, a proposta do Tratado de Tordesilhas, de 1494.
O Tratado de Tordesilhas
D. João II pediu que a linha imaginária fosse movida para mais de 1.500 km de Cabo Verde. Isso garantiria a Portugal as terras ao leste da linha, com o oeste ficando com a Espanha.
Como o mapa de Colombo não mostrava territórios no lado português, os reis Fernando de Aragão e Isabel de Castela concordaram com a exigência do monarca português.
Nos anos seguintes, Portugal prosseguiu no seu projeto de alcançar a Índia, o que foi finalmente alcançado pela frota de Vasco da Gama, em 1498.
Em 1500, com a chegada de Pedro Álvares Cabral, Portugal incorporou a parte da América que lhe cabia pelo tratado. Ao longo de trezentos anos, sua presença na região expandiu o território que acabou sendo a única parte do continente americano em que se fala português.
Um meridiano nunca demarcado
O Tratado de Tordesilhas apenas especificou a linha de demarcação como uma linha direta de polo a polo 370 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde. Não especificava a linha em graus meridianos, nem quantas léguas entravam em um grau, nem identificava a ilha a partir da qual deveriam ser contadas as 370 léguas. O tratado afirmava que essas questões seriam estabelecidas por uma expedição conjunta que nunca ocorreu. Ao final, a demarcação do limite nunca foi realizada e cada parte interpretou o tratado conforme sua conveniência.
O Tratado de Tordesilhas tornou-se obsoleto quando as outras potências coloniais – França, Holanda e Reino Unido- montaram frotas navais poderosas o suficiente para desafiar a divisão das terras entre Portugal e Espanha. Além da captura de algumas colônias espanholas na América Central, essas potências estenderam seus domínios ocupando terras mais ao norte, incluindo os atuais territórios dos Estados Unidos e Canadá, além de promoverem ataques de piratas e corsários contra as colônias espanholas e portuguesas
Na América portuguesa, o Tratado de Tordesilhas nunca foi plenamente respeitado e, por isso, outros tratados foram feitos durante a colonização.
A pequena cidade de Tordesilhas
Tordesilhas, a cidade que deu nome ao tratado, tem menos de 10 mil habitantes. Fica às margens do rio Douro, na província espanhola de Valladolid, um local de fácil acesso, na encruzilhada de estradas importantes no século XV.
Na época do tratado, era uma cidade importante de Castela, cercada por uma muralha e com cerca de 3.500 habitantes. Sua ponte sobre o rio Douro a tornava um ponto estratégico de passagem.
As reuniões entre os embaixadores de D. João II e os reis católicos ocorreram em um palácio recém-construído na cidade. Sobre sua porta se encontravam o brasão real dos reis católicos e o do seu proprietário, Alfonso González de Tordesilhas. Hoje o prédio foi transformado no Museu do Tratado.
O rei português estava doente e por isso permaneceu em Setúbal durante toda negociação. Da cidade portuguesa, a 50 quilômetros ao sul de Lisboa, entretanto, ele trocava mensagens constantemente com os seus embaixadores. Ele faleceu no ano seguinte, aos 38 anos.
A totalidade das descobertas portuguesas do reinado de D. João II permanece desconhecida. Muita informação foi mantida em segredo por razões políticas e os arquivos do período foram destruídos no terremoto de 1755. Os historiadores ainda discutem a sua verdadeira extensão, suspeitando que navegadores portugueses chegaram à América antes de Cristóvão Colombo.
O Tratado de Tordesilhas original está em posse dos espanhóis guardado no Arquivo Geral de Índias, em Sevilha, que abriga toda a documentação do período colonial espanhol. É o único documento espanhol inscrito no registro “Memória do Mundo” da UNESCO, criado em 1992 para preservar os documentos patrimônios da humanidade.
Fonte
- HERMANN, Jacqueline. Tratado de Tordesilhas In: VAINFAS, Ronaldo. Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
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Abertura
Assinatura do Tratado de Tordesilhas, ilustração de Antônio Menendez.