Em 26 de novembro de 1922, o arqueólogo britânico Howard Carter, depois de semanas de trabalho e preparos, finalmente entrou na tumba de Tutancâmon encontrando milhares de objetos preciosos. A descoberta o deixou maravilhado (em suas próprias palavra) e rapidamente chegou à Europa e aos Estados Unidos através de jornais, fotografias, telegramas e rádio causando tamanho fascínio a ponto de alimentar uma onda de egiptomania.
A egiptomania inspirou a moda, a produção de bens de consumo (especialmente objetos decorativos), a música e, principalmente, o cinema com filmes de temas históricos (Cleópatra era o preferido) e de suspense e terror de múmias vingativas e assassinas.
Sumário
- Como tudo começou: a parceria Carter e Carnavon
- Mais alguns anos de espera
- A descoberta do túmulo de Tutancâmon
- Os trabalhos na antecâmara
- A câmara funerária e o sarcófago de Tutancâmon
- Oito anos de trabalho
- Fonte
Como tudo começou: a parceria Carter e Carnavon
Howard Carter era um arqueólogo experiente. Aos 17 anos começou a trabalhar no Museu Britânico participando de expedições arqueológicas como desenhista e pintor no Egito. Em 1902 e 1903, supervisionou as escavações nos túmulos de Tutmés IV e de Hatshepsut, fez trabalhos de restauro nos túmulos de Amenhotep II, Seti I, Ramsés I, III, IV e IX nos quais instalou luz elétrica.
Depois de um incidente com turistas franceses no Egito que acabou se tornando uma questão diplomática, Carter foi demitido. Permaneceu no Egito trabalhando como pintor, guia turístico e intérprete em Luxor.
Foi nesse momento que veio o convite de lorde Carnavon, um aristocrata britânico que levava uma vida despreocupada entre viagens de aventura, fotografia, golfe e jantares elegantes. Durante uma temporada de meses no Egito, Carnavon começou a se interessar por arqueologia. Comentou sobre isso com o diretor da Administração Egípcia de Antiguidades no Cairo que lhe recomendou Howard Carter.
A parceria entre Carter e Carnavon começou em 1907 e eles partiram para Tebas, onde escavaram a necrópole do vale de Deir el-Bahari entre 1901 e 1910. Fizeram algumas descobertas importantes entre as quais dois templos considerados “desaparecidos”, o de Hatschepsut e de Ramsés IV (cerca de 1154-1148 a.C.).
O desejo maior de ambos era escavar o Vale dos Reis onde já haviam sido escavados 25 entradas de túmulos e, por isso, era considerado, pelos especialistas, um sítio arqueológico já esgotado. A licença para escavação veio em 1915 com a assinatura de um documento que detalhava em 13 cláusulas como os trabalhos deveriam ser conduzidos.
A Primeira Guerra Mundial (1914-1918), contudo, atrasou os planos pois lorde Carnavon foi convocado para servir à Inglaterra instalando em seu castelo um hospital militar.
Mais alguns anos de espera
Terminada a guerra, Carnavon estava arruinado e, portanto, sem possibilidade de arcar com as despesas de uma escavação arqueológica.
No entanto, Howard Carter conseguiu convencer Carnavon a iniciar os trabalhos de escavação. O aristocrata britânico buscou dinheiro junto ao jornal londrino The Times ao qual concedeu exclusividade para publicar, em primeira mão, notícias e fotografias de tudo fosse encontrado.
Esse tipo de acordo, extremamente incomum na época, garantiu o financiamento de um trabalho altamente oneroso e assegurou o interesse contínuo da imprensa e, por conseguinte, do público que acompanha cada passo da escavação.
Depois de 4 temporadas de trabalho no Vale dos Reis, sem qualquer resultado animador, Carnavon regressou à Inglaterra enquanto Carter realizava a última temporada de escavação. Era sua última chance.
A descoberta do túmulo de Tutancâmon
Os trabalhos começaram em 1º de novembro de 1922 em um local improvável: logo abaixo da entrada do túmulo de Ramsés VI onde havia restos de construções dos trabalhadores de cerca de 3000 anos. As escavações chegaram às fundações e, em 4 de novembro, foi encontrada uma escada de 16 degraus que levava para baixo e chegava a uma porta de pedra selada. Nela havia lacres com hieróglifos onde se lia o nome de Tutancâmon.
Era preciso avisar Carnavon do achado e chama-lo de volta ao Vale dos Reis. Carter mandou cobrir a escada de pedra e deixou alguns trabalhadores vigiando o local. Aguardou três semanas para o regresso de Carnavon que chegou a Luxor no dia 23 de novembro acompanhado de sua filha.
Na manhã do 25, a porta selada foi removida e o que encontraram foram pedras e lascas de calcário até o topo. Removido o entulho, perceberam que era uma passagem de 6 metros que chegava a outra porta selada, semelhante a primeira.
Carter abriu um pequeno buraco no canto superior esquerdo. Inseriu um bastão de ferro para ver se havia mais entulho no local, mas o bastão não encontrou obstáculo. O local parecia vazio. Carter abriu um pouco mais o buraco, o suficiente para inserir uma vela acesa e ver o que havia ali dentro. Ele relata o que aconteceu, então:
“Logo que meus olhos se acostumaram à luz, detalhes da sala surgiram lentamente da névoa, animais estranhos, estátuas e ouro – em todo lugar o brilho de ouro. (…) Fiquei mudo de espanto, e quando lorde Carnarvon, incapaz de suportar o suspense por mais tempo, perguntou ansiosamente – “Você consegue ver alguma coisa?” – tudo que eu pude dizer foi: “Sim, coisas maravilhosas”.
Na manhã seguinte, 26 de novembro de 1922, a porta foi removida revelando a antecâmara atulhada de caixas, cadeiras, vasos, sofás, carruagens desmontadas, estátuas – a maioria de ouro. A tumba KV62 (Kings’ Valley 62) do faraó Tutacâmon havia sido descoberta.
Na parede oposta, havia duas estátuas de guardiões, em tamanho natural, uma de frente para a outra. Entre elas, uma porta também selada. Ela levaria semanas para ser aberta. Antes disso, era preciso remover todos os objetos da antecâmara.
Os trabalhos na antecâmara
A remoção de cada peça foi planejada para não a danificar por escombros ou um movimento errado. Os objetos foram fotografados, numerados, catalogados, limpos e descritos, um a um. Carter pediu e recebeu a ajuda de um grande número de especialistas.
Os objetos saíam da tumba enrolados em gaze e levados em macas até uma oficina de conservação improvisada no túmulo de Seti II, próximo dali. Assim que as macas saíam do túmulo, uma multidão de turistas e repórteres aguardavam no alto da tumba. A notícia da descoberta espalhou-se pelo mundo e atraiu centenas de pessoas
As macas seguiam para a oficina de conservação que era, também, estúdio fotográfico, depósito e carpintaria (para fazer as caixas de madeira para transportar os objetos de trem até o Cairo).
Os trabalhos na antecâmara levaram mais de dois meses.
A câmara funerária e o sarcófago de Tutancâmon
No dia 16 de fevereiro de 1923 foi removida a porta selada entre as estátuas dos guardiões e, com isso, pode-se entrar na câmara funerária. Ela estava quase totalmente ocupada por uma grande caixa de madeira dourada: era o santuário que guardava o sarcófago de Tutancâmon. Nas laterais, junto ao santuário estavam 11 remos para a Barca do Sol, recipientes para incenso, lanternas decoradas com imagens do deus Hapy (filho de Hórus).
O santuário tinha de 5 m de comprimento, 3 m de largura e 2,75 m de altura. Não era uma peça única: dentro havia outros três santuários. O último deles, mais interno, media 2,90 m de comprimento e 1,48 m de largura. Suas paredes estavam decoradas com imagens funerárias e, no teto Nut, a deusa do céu, abraçava com suas asas o sarcófago de granito.
O sarcófago feito de um único bloco de pedra, media 2,75 m de comprimento, 1,33 m de largura e 1,49 m de altura. Era fechado com uma tampa de granito rosa pesando 1250 kg. Dentro do sarcófago havia três caixões antropomórficos, um dentro do outro. Os dois primeiros feitos de madeira de cipreste e o último feito de 110,4 kg de ouro puro. Dentro dele, a múmia de Tutancâmon com a máscara mortuária de ouro, lápis-lazúli, cornalina, quartzo, obsidiana, turquesa e vidro pesando 11 kg.
A múmia estava embrulhada em 16 camadas de bandagens de linho e dentro de cada camada havia numerosas peças de joalheria e amuletos, figuras divinas e dois punhais de ouro. A múmia usava peitoral, colares, braceletes, brincos e tinha os dedos das mãos e dos pés cobertos com dedeiras douradas.
O exame da múmia revelou que o faraó tinha entre 17 e 19 anos quando morreu.
Oito anos de trabalho
Os trabalhos na tumba KV62 duraram 8 anos. A remoção da tampa de cada sarcófago foi tarefa cuidadosamente planejada. A múmia de Tutancâmon só foi revelada em 28 de outubro de 1925, quase três anos depois de encontrado o acesso à tumba. Lorde Carnavon não assistiu esse momento tão esperado: ele falecera dois anos antes, em 5 de abril de 1923.
Depois do exame da múmia, havia ainda outras duas câmaras para investigar: a câmara do tesouro e o anexo, com outras centenas de peças valiosas. Finalmente, em 10 de novembro de 1930, foram removidos os últimos objetos e os trabalhos encerrados.
A múmia de Tutancâmon foi mantida dentro do túmulo e só saiu para um exame de Raio-X em 1968. Durante muito tempo, não ficou exposta aos visitantes. É a única múmia real que permaneceu em seu próprio túmulo desde a descoberta de uma tumba até hoje.
O enceramento dos trabalhos não pôs fim ao interesse pela tumba e a múmia de Tutancâmon. A enorme quantidade de material recolhido consumirá décadas para ser inteiramente analisada e avaliada pelos historiadores e arqueólogos. Há caixas ainda fechadas no Museu do Cairo aguardando o início de seus estudos.
O público, por sua vez, além do fascínio suscitado pela descoberta, foi cativado pela lenda da “maldição do faraó” contra aqueles que perturbaram seu sonho eterno. A lenda inspirou (e ainda inspira) filmes, vídeos, desenhos animados, literatura de ficção, jogos eletrônicos etc.
Fonte
- Treasures of Tutankhamun. Nova York: The Metropolitan Museum of Art, 1976.
- CARTER, Howard. Tutancâmon: anatomia de uma escavação anatomia de uma escavação. Diários: 1ª temporada, 28 de outubro a 31 de dezembro de 1922.
- CARTER, Howard. Diários: Tutancâmon: anatomia de uma escavação anatomia de uma escavação. Diários: 2ª temporada, 3 de outubro a 11 de fevereiro de 1924.
Saiba mais
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