O calendário religioso de Roma Antiga era repleto de festejos e ritos aos deuses, mas nenhum era mais aguardado do que as Saturnálias, as festas em honra a Saturno. Saturno, equivalente ao titã grego Cronos, era o deus do tempo, da geração, da dissolução, abundância, riqueza, agricultura, renovação periódica e libertação.
As Saturnálias aconteciam, inicialmente, no dia 17 de dezembro. A popularidade das festividades era tanta que os romanos estenderam os festejos. No tempo de Augusto, mais dois dias foram acrescentados e eles se tornaram oficiais entre os dias 17 e 19. Depois, com Calígula, as festas estenderam-se por cinco dias, e sob Diocleciano, duraram uma semana, de 17 a 23-24 de dezembro.
Como Saturno era festejado
As Saturnálias começaram a ser celebradas em 497 a.C., quando um templo foi dedicado a Saturno no Fórum Romano. Sua festa ocorria pouco antes do solstício de inverno, quando o trabalho no campo havia terminado e os camponeses pediam proteção das lavouras que ficariam por meses sob frio intenso. Era também um período de descanso do duro trabalho no campo.
Na mitologia romana, Saturno era uma divindade agrícola que teria reinado sobre o mundo na Idade de Ouro, quando os humanos desfrutavam da espontânea generosidade da terra sem precisar trabalhar e vivendo em um estado de inocência. As folias da Saturnália deveriam refletir as condições da perdida “Era Dourada” antes que o governo de Saturno fosse derrubado.
Por isso, durante a Saturnália, as restrições sociais eram relaxadas. Ocorria uma inversão de papéis em que as mulheres se vestiam como homens e os homens se vestiam como mulheres, não havia mais divisão social em escravos e livres, os escravos desfrutavam de completa licença até para insultar seus senhores sem ameaça de punição.
As escolas eram fechadas, o trabalho cessava, os tribunais não funcionavam, as execuções estavam proibidas e ninguém poderia ser condenado naqueles dias festivos. Nenhuma declaração de guerra poderia ser feita e os legionários relaxavam podendo tirar sua lorica (armadura) e seu gládio.
Apostas e jogos de dados, normalmente proibidos ou pelo menos desaprovados, eram permitidos para todos, até mesmo para os escravos que podiam até jogar com seu senhor. Comer demais e embriaguez desenfreada eram a regra, e uma pessoa sóbria a exceção.
As Saturnálias era um tempo de excessos, libertinagem e licenciosidade. “O caos e a agitação tomavam conta de Roma, colocando a razão e o bom senso de lado naquela semana. A inversão da ordem natural era celebrada em muitos aspectos da vida cotidiana” (MARQUÉS, 2018).
Os banquetes e os presentes da Saturnália
Durante as Saturnálias as casas eram enfeitadas com plantas que se mantinham verdes no inverno, como os galhos de pinheiros e as folhas de azevinho. Acendiam-se velas festivas.
O elemento mais característico eram os banquetes e, seguindo os costumes da Saturnália, aqui também invertia-se a ordem social. O escritor e filósofo Macróbio Ambrósio Teodósio, em sua obra Saturnais, do século V, relata o seguinte:
“O chefe da casa dos escravos (…) veio dizer ao seu senhor que a casa havia festejado de acordo com o ritual anual costumeiro. Pois, nesta festa, nas casas que guardam o costume religioso, eles primeiro honram os escravos com um jantar preparado com se fosse para o senhor; e só depois a mesa é posta novamente para o chefe da família. Então, o escravo chefe entrou para anunciar a hora do jantar e chamar os mestres para a mesa.” (MACRÓBIO, Saturnais 1.24.22-23).
Durante o banquete das Saturálias, “não é permitido a ninguém se ocupar com assuntos públicos e nem permanecer vestido com a toga” e nem os generais usarem o manto militar (ANDRADE, 2016).
O último dia das festividades era conhecido como sigillaria – nome das estatuetas de cerâmica que se costumavam presentear parentes e amigos. Essas figuras eram modeladas a partir das feições de alguma divindade ou herói mítico como Minerva, Apolo, Vênus, Vitória ou Hércules.
Lojas temporárias eram erguidas no Campo de Marte e no pórtico das Termas de Trajano para vender as sigillaria e também outros presentes como velas, chapéus e meias de lã.
As Saturnálias foram, sem dúvida, uma das festas mais aclamadas e alegres do mundo antigo. Eram tão populares que algumas das suas tradições se mantiveram até o século VI quando o cristianismo já estava oficializado, como se pode ver na obra de Macróbio, escrita no século V. Para muitos historiadores, as Saturnálias são o embrião do Natal.
No ano 274, o imperador Aureliano introduziu o culto em homenagem a Mitra, o deus Sol Invicto, “Sol Invencível” realizado no dia 25 de dezembro e que fechava o período das Saturnálias. A celebração ao Sol Invicto ganhou força no calendário civil romano e acabaria sendo apropriada pelo cristianismo no século seguinte.
Fonte
- LUCIANO. Saturnalia.
- MACRÓBIO. Saturnales. Tradução de Fernando Navarro Antolín. Madrid: Gredos, 2010.
- GONZALEZ, Néstor F. Marqués. Un año en la antigua Roma. La vida cotidiana de los romanos a través de su calendario. Espasa: 2018.
- ANDRADE, Jenny Barros. Corpo e festa na Antiguidade tardia: o convivium nas Saturnais, de Macróbio. Revista Cadernos de Clio: Curitiba, UFPR, v.7, n.1, 2016.
Saiba mais
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