Em 31 de outubro de 1517, o monge alemão e professor de teologia, Martinho Lutero enviou uma carta ao arcebispo de Mainz, denunciando as práticas abusivas dos pregadores de venda de indulgência. A data é considerada o fator desencadeador da Reforma Protestante e comemorada anualmente como o Dia da Reforma Protestante.
Anexada à carta, estavam as célebres 95 Teses ou Disputação do doutor Martinho Lutero sobre o Poder e Eficácia das Indulgências – uma lista de proposições para serem levadas a uma discussão acadêmica. Não tinham a intenção de iniciar uma revolução contra o papa e a Igreja.
No cabeçalho do documento, Lutero convidava estudiosos interessados de outras cidades para participarem da discussão. A realização de tal debate era uma forma comum de investigação acadêmica. Poucos meses antes, em abril de 1517, Andreas Karistadt, também professor de teologia da Universidade de Wittenberg , apresentara suas teses para discussão sob o mesmo tema, porém mais radicais em termos teológicos do que as de Lutero.
CONTEÚDO
- A polêmica da fixação das 95 Teses
- O escândalo das 95 Teses
- O conteúdo das 95 Teses
- Fonte
- Saiba mais
1. A polêmica da fixação das 95 Teses
Há controvérsias se Lutero, de fato, pregou as 95 Teses, com um martelo, na porta da igreja do castelo de Wittenberg. Era uma atitude comum e Andreas Karistadt, por exemplo, fizera isso com as suas teses. Ao propor uma discussão acadêmica, era costume publicar as teses na imprensa universitária e anexá-las publicamente.
Entretanto, não existem cópias da primeira publicação das 95 Teses pela Universidade de Wittenberg. Isso não é surpreendente, visto que Lutero não era famoso e a importância do documento não foi reconhecida na época. O próprio papa Leão X, ao ser informado do que acontecia, teria dito que Lutero não passava de um “alemão bêbado” afirmando que “quando estivesse sóbrio mudará de opinião”.
Não obstante, entre a elite intelectual de Wittenberg, as 95 Teses tornaram-se bem conhecidas. As 95 Teses foram logo traduzidas para o alemão e amplamente copiadas e impressas. Ao cabo de duas semanas se haviam espalhado por toda a Alemanha e, em dois meses, por toda a Europa. Pela primeira vez na História, a imprensa teve papel fundamental, pois facilitou a distribuição simples e ampla do documento.
2. O escândalo das 95 Teses
A carta de Lutero com as Teses chegou ao arcebispo de Mainz no final de novembro. Este buscou conselhos junto aos teólogos da Universidade de Mainz que recomendaram que ele proibisse Lutero de pregar contra as indulgências. O arcebispo solicitou ao papa Leão X que tomasse tal atitude. Este, por sua vez, ordenou ao superior dos agostinianos, a ordem religiosa de Lutero, que mandasse o monge parar de difundir suas ideias.
A partir daí as 95 Teses foram ganhando dimensão dando início a uma guerra panfletária entre Lutero, seus simpatizantes e opositores. Johan Tetzel, o pregador de indulgências que inspirou as 95 Teses, propôs que Lutero fosse queimado por praticar heresia e encomendou ao teólogo Konrad Wimpina da Universidade de Frankfurt que escreve 106 Teses para contrapor às de Lutero. A resposta de Lutero ao panfleto de Tetzel, por outro lado, foi outro sucesso de publicação.
Outros acusaram Lutero de heresia e estupidez. Lutero respondeu com maior virulência. Os superiores de Lutero exigiram que ele se retratasse, mas ele insistia que o caso fosse exposto aos teólogos universitários. O pedido foi negado e Lutero, então, apelou diretamente ao papa. A resposta de Leão Xl foi uma ameaça: ou Lutero se retratava ou seria excomungado. Lutero queimou a bula pontifícia e foi excomungado em janeiro de 1521.
3. O conteúdo das 95 Teses
Embora as indulgências tenham inspirado as 95 Teses marcando o início da Reforma Protestante, Lutero as considerava insignificantes em relação a outras questões teológicas que eram mais graves. Segundo ele, as Teses apenas denunciavam que a Igreja estava se desviando do verdadeiro pensamento cristão e isto colocava os leigos em grave perigo. Lutero escreveria, posteriormente que, quando formulou as Teses, ele ainda se mantinha fiel à doutrina católica e não imaginava que suas ideias levassem à uma ruptura com o papa e a Igreja.
Teses 1-4: Os pecados são perdoados por Cristo mediante o arrependimento espiritual interior em não através de uma confissão sacramental externa celebrada pelos sacerdotes.
Teses 5–7: O papa não pode redimir culpa alguma, mas apenas declarar que foi perdoada por Deus.
Teses 14–29: Estão erradas ou distorcidas as crenças sobre o purgatório. A pessoa não é absolvida de todas penas e salva pelas indulgências do papa (21). “A maior parte do povo está sendo ludibriada por essa magnífica e indistinta promessa de absolvição da pena” (24). Pagar pela indulgência do papa só pode aumentar o lucro e a cobiça da igreja (29).
Teses 30–40: A carta de indulgência não é garantia de salvação. Não há como saber se uma pessoa está verdadeiramente arrependida e, portanto, nenhum documento mesmo assinado pelo papa garante a salvação e nem a carta de indulgência torna o arrependimento desnecessário.
Teses 41–47: As cartas de indulgências desencorajam obras de misericórdia por aqueles que as compram. Praticar a caridade é incomparavelmente mais importante do que comprar indulgências, já que a compra de uma indulgência sem dar nada aos pobres provoca a ira de Deus. Uma pessoa torna-se melhor ao praticar boas obras, e não por compras indulgências.
Teses 56-66: o verdadeiro tesouro da Igreja são os Evangelhos de Jesus Cristo. Os Evangelhos são “as redes com que outrora se pescavam homens ricos” enquanto as indulgências são “redes para pescar a riqueza dos homens”.
Teses 67-80: discorrem sobre os problemas causados pela forma como as indulgências estavam sendo pregadas.
Teses 81-91: apresentam as objeções feitas pelos fiéis para as quais não há respostas e que ignorar estas questões significa expor a igreja e o papa à zombaria dos inimigos e fazer os cristãos infelizes.
Teses 92-95: exortam os cristãos a se esforçarem por seguir Cristo, seu cabeça.
Fonte
- FEBVRE, Lucien. Martinho Lutero: um destino. Ed.Publifolha, 2013.
- LINDBERG, Carter. História da Reforma. Ed. Thomas Nelson, 2017.
- LINDBERG, Carter. As Reformas na Europa. Ed. Sinodal &Lpeg, 2002.
- 95 Teses de Lutero. Domínio Público. Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil.
- 95 Teses. Biblioteca Nacional Digital.
Saiba mais / outros recursos
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