Em 2 de julho de 1823, chegou ao fim o movimento iniciado no ano anterior contra o governo português. Nesta data foram expulsos da Bahia o almirante português Madeira de Melo e seus homens selando o que ficou conhecido como a independência da Bahia. Mas, o nome correto seria independência do Brasil na Bahia uma vez que essa província lutou pelo império brasileiro e a vitória significou a consolidação da independência do Brasil e da unidade nacional.
A partir do Dia do Fico (9 de janeiro de 1822), Portugal passou a concentrar seus esforços militares em Salvador. Enviou à Bahia cerca de 2.500 homens para reforçar os contingentes militares fiéis à Metrópole, aos quais se juntaram integrantes da Divisão Auxiliadora, que haviam sido expulsos pelo príncipe regente do Rio de Janeiro.
Portugal pensava em dividir o Brasil em dois: manteria o Norte e Nordeste sob seu domínio e deixaria o Sul e Sudeste sob o governo de D. Pedro. Além disso, a metrópole alimentava a ideia de que, dominada a Bahia, suas tropas poderiam atacar o Rio e sufocar de vez as pretensões separatistas. Não contava, contudo, com a resistência baiana.
Além disso, a própria sociedade baiana estava cindida. Os grandes comerciantes, quase todos lusitanos, e os latifundiários brasileiros donos de extensas terras produtoras de açúcar e tabaco à custa do trabalho escravo, temiam os movimentos emancipacionistas que, para eles, acenavam como a ameaça abolicionista e o fim dos privilégios sociais. O clima na província era de ódio e de confrontos entre populares “brasileiros” e “portugueses”. Populares em bandos atacavam os militares portugueses a pedradas em locais como a Baixa dos Sapateiros. Estes revidavam quebrando vidraças e lanternas nas ruas.
Conflitos em Salvador
A Revolução do Porto (1820) teve enorme repercussão na Bahia, onde era grande o número de portugueses. Com o retorno de D. João VI a Portugal (abril de 1821), permanecendo no Rio de Janeiro, D. Pedro como príncipe-regente, aceleraram-se os conflitos entre brasileiros e portugueses.
Em novembro de 1821, soldados portugueses saíram pelas ruas de Salvador, atacando soldados brasileiros, num confronto corporal na Praça da Piedade, registrando-se mortos e feridos. A população, temerosa, afastou-se da capital buscando refúgio nos sítios do Recôncavo.
Em 11 de fevereiro de 1822, chegou a notícia da nomeação do português Madeira de Melo como comandante das armas da província baiana. Ele substituiria o brigadeiro Manuel Pedro favorável aos brasileiros e tinha a missão de submeter o povo baiano às ordens de Portugal. O conflito estava armado.
As tropas portuguesas percorriam as ruas, fazendo provocações, inspecionando as fortificações, desafiando as guarnições de maioria nacional. Na madrugada do dia 19 tiros foram disparados do Forte de São Pedro para onde acorreram as tropas portuguesas. Salvador transformou-se numa praça de guerra, e confrontos violentos ocorreram nas Mercês, na Praça da Piedade e no Campo da Pólvora.
As tropas portuguesas tomaram o quartel, atacaram casas e invadiram o Convento da Lapa onde alguns revoltosos tinham se refugiado, vindo a assassinar a sua abadessa, Sóror Joana Angélica (19 de fevereiro de 1822).
Restava tomar o Forte de São Pedro. Madeira de Melo preparou-se para bombardear a fortificação — uma das poucas inteiramente em terra, no centro da cidade. No dia seguinte, o forte rendeu-se, evitando-se o derramamento de sangue. O brigadeiro Manuel Pedro foi preso e enviado a Lisboa.
As tensões continuaram. Os brasileiros ainda na capital reagiram com pedradas às ações militares de Madeira de Melo e, na procissão de São José (21 de março de 1822), os portugueses foram apedrejados.
A cidade de Cachoeira rompe com Portugal
Enquanto isso, no Rio de Janeiro, o príncipe regente aproximava-se cada vez dos brasileiros em franca oposição às ordens de Portugal. Demitiu todos os portugueses que fazia parte de seu conselho de ministros e formou um novo conselho formado somente por brasileiros.
Em maio de 1822, foi instituído o chamado “Cumpra-se” que determinava que qualquer ordem vinda de Portugal só poderia ser cumprida com a aprovação prévia de D. Pedro.
Em junho de 1822, Dom Pedro resolveu compor uma Assembleia Constituinte que deveria formar um conjunto de leis básicas a serem aplicadas em todo território nacional.
Diante desses fatos, os deputados baianos nas Cortes de Lisboa consultaram por carta os seus distritos para saber qual deveria ser a relação da Bahia com a metrópole. As vilas de Cachoeira, Santo Amaro e São Francisco do Conde manifestaram-se favoráveis a que a província ficasse submetida à regência de D. Pedro.
Afrontado, o comandante Madeira de Melo mandou uma escuna militar para Cachoeira, a 120 km de Salvador. Os “brasileiros” reagiram e, a 25 de junho de 1822, Cachoeira proclamou que ficaria ao lado de D. Pedro e contra a coroa portuguesa.
Seguiu-se combate pela tomada da embarcação que, cercada por terra e água, resistiu até à captura e prisão dos sobreviventes, em 28 de junho. Outras vilas do Recôncavo aderiram à luta de Cachoeira. Enquanto isso, Salvador, tornou-se alvo de maiores opressões por parte de Madeira de Melo. O povo da capital fugiu, engrossando as hostes que se concentravam no Recôncavo.
Todos estes movimentos foram comunicados ao príncipe regente D. Pedro. Portugal enviou 750 soldados para a manutenção da ordem na Bahia. Os reforços portugueses chegaram em agosto.
A luta continua após o Sete de Setembro
Em outubro, logo a pós a proclamação da independência (Sete de Setembro), chegou do Rio de Janeiro o primeiro reforço aos patriotas baianos, sob o comando do francês general Pedro Labatut. Era uma tropa constituída quase toda por portugueses, já que ainda não existia um exército verdadeiramente nacional.
O seu desembarque foi impedido em Salvador, indo aportar em Maceió, Alagoas, de onde foi, por terra até Salvador. Ocorreram as batalhas de Cabrito, Pirajá e o bloqueio marítimo de Salvador.
Finalmente em 2 de julho de 1823, Madeira de Melo derrotado, mas sem se render formalmente, embarcou com o que restava de suas tropas de volta a Portugal. Por isso essa data é considerada como a da independência da Bahia.
Homenagem ao indígena
Importante participação nas lutas teve o elemento indígena, identificado simbolicamente como o “verdadeiro brasileiro”, o dono da terra, que somara seus esforços aos demais combatentes.
A Bahia rendeu-lhe homenagens sempre ostensivas e, em 1896 foi erguido na capital baiana um monumento à independência da Bahia tendo ao alto a figura do caboclo.
Na cidade de Caetité, que todos os anos festeja o Dois de Julho com grande pompa, a figura de uma cabocla surge num dos carros, matando o “Dragão da Tirania“, que representa o colonizador português vencido.
Fonte
- MARTINEZ, Socorro Targino. 2 de julho: a festa é história. Salvador: Fundação Gregório de Mattos, 2000.
- GUERRA FILHO, Sérgio Armando Diniz. O povo e a guerra. Participação das camadas populares nas lutas pela independência do Brasil na Bahia. Dissertação (Mestrado), Salvador (BA): Universidade Federal da Bahia, 2004.
- SANTOS, Joel Rufino dos. O dia em que o povo ganhou. São Paulo: Círculo do Livro, 1983.
- A Guerra da Independência: o Brasil despedaçado. Revista de História Biblioteca Nacional, n. 48, ano 4, 2009.
- TAVARES, Luís Henrique Dias. A independência do Brasil na Bahia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982.
- FARIAS, Eny Kleyde Vasconcelos. Maria Felipa de Oliveira: heroína da independência da Bahia. Salvador: Quarteto, 2010.
- CANÁRIO, Eldon Dantas. O sol do Dois de Julho. Salvador: Ponto e Vírgula, 2008.
- Silva, Marcelo Renato Siquara. Independência ou morte em Salvador: o cotidiano da capital da Bahia no contexto do processo de independência brasileiro (1821-1823). Dissertação de Mestrado, UFBA, 2012.
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