O Dia Internacional do Trabalhador ou Dia Mundial do Trabalho é celebrado anualmente no dia 1º de Maio em numerosos países sendo feriado em muitos deles. A história desse dia não se limita a um fato específico nem a personagens individualizados, mas, ao contrário, é uma história coletiva que envolveu trabalhadores de diferentes países. É uma história com marcos importantes, porém difícil de se delimitar quando começou e (se) terminou.
Desde 1890, a data tem sido comemorada pelos trabalhadores, inicialmente na Europa e depois em outros continentes. O final do século XIX foi uma época de forte crescimento industrial quando formaram-se empresas gigantes sob a forma de trustes, cartéis e holdings. A concentração industrial acabou com os pequenos negócios e monopolizou o mercado. A produção industrial expandiu com a adoção do taylorismo, método criado por Frederick Taylor em 1884 de produção em série, que padronizou produtos e barateou os custos de produção.
Enquanto isso, no interior das fábricas e das minas, as condições de trabalho degradavam: ambientes insalubres, baixos salários e jornadas de doze até quatorze horas diárias eram o cenário de homens, mulheres e crianças operárias. O movimento socialista e anarquista expandia-se unindo trabalhadores para lutarem por seus direitos.
CONTEÚDO
- A Revolta de Haymarket (1886), em Chicago, EUA
- Instituído o 1º de Maio pelos trabalhadores
- O massacre de Fourmies (1891), França
- Por que foi escolhido o dia 1º de Maio?
- A conquista da jornada de 8 horas diárias
- Inclusão e manipulação do 1º de Maio
A grande reivindicação e a mais difícil de ser conquistada era a redução da jornada de trabalho para oito horas diárias. O lema “8 horas de trabalho, 8 horas de recreação e 8 horas de descanso”, criado por Robert Owen em 1817, estava presente em manifestações operárias em todo mundo. Em 1866, a reivindicação da jornada de oito horas foi incluída no programa da Primeira Internacional.
A luta pela jornada de oito horas diárias atravessou o século e só alcançou seu objetivo no período entre guerras. Antes disso, teve dois momentos trágicos, nos Estados Unidos em 1886, e na França em 1891. Esses fatos deram maior força ao 1º de Maio.
A Revolta de Haymarket (1886), em Chicago, EUA
Em 1884, durante a quarta reunião da Federação Americana do Trabalho, os principais sindicatos de trabalhadores norte-americanos estabeleceram dois anos para que os empregadores reduzissem a jornada de trabalho de 13 para 8 horas diárias. Marcaram a data limite para o atendimento de sua reivindicação no dia 1º de Maio de 1886.
Naquela data, muitos trabalhadores tiveram seu pedido atendido. Outros milhares, contudo, cerca de 340 mil, entraram em greve para forçarem seus empregadores a cederem.
Foi assim que, em Chicago, a greve foi prolongada em algumas empresas. No dia 3 de maio, a manifestação dos operários da McCormick Harvester terminou em confronto com a polícia e a morte de três operários.
No dia seguinte, 4 de maio, realizou-se uma grande marcha de protesto e, à noite, quando os grevistas já se dispersavam na praça Haymarket, uma bomba estourou junto aos policiais, matando um e ferindo outros sete que morreram mais tarde. A polícia abriu fogo contra os manifestantes, ferindo dezenas e matando onze.
Os oito organizadores da manifestação, militantes anarquistas, foram presos e condenados, mesmo sem provas que os ligassem ao lançamento da bomba. Finalmente, quatro deles foram executados, um cometeu suicídio antes do enforcamento, e os restantes condenados à prisão perpétua, revogada em 1893, quando o governador de Illinois concluiu que os oito acusados eram inocentes e que o chefe da polícia de Chicago havia ordenado o ataque para justificar a repressão que se seguiu.
Instituído o 1º de Maio pelos trabalhadores
Três anos após a tragédia de Chicago, durante a Segunda Internacional Operária Socialista, em Paris, em julho de 1889, foi proposta a data de 1º de Maio como Dia Internacional do Trabalho. A data foi escolhida em homenagem aos mártires de Chicago. A iniciativa foi de Raymond Lavigne, um militante socialista belga, na seguinte moção:
“Será organizada uma grande manifestação internacional com data fixa, de modo que,em todos os países e em todas as cidades ao mesmo tempo, no mesmo dia marcado, os trabalhadores intimem os poderes públicos a reduzir legalmente a jornada de trabalho a oito horas e a aplicar as outras resoluções do Congresso Internacional de Paris.”
Alguns meses mais tarde, em Bruxelas, a Internacional Socialista renova o protesto e o caráter internacional do Primeiro de Maio.
O 1º de Maio ganhou força entre operários de todo mundo. A partir de 1890, os trabalhadores passaram a comemorar a data com a paralisação do trabalho no dia 1º de Maio, e desfiles nas ruas usando, na lapela, um triângulo vermelho para simbolizar o lema: “8 horas de trabalho, 8 horas de recreação e 8 horas de descanso”. Mais tarde, o triângulo foi substituído por uma flor vermelha.
O massacre de Fourmies (1891), França
A comemoração do 1º de Maio de 1891 em Fourmies, uma pequena cidade industrial no norte da França, acabou em tragédia. A manifestação em defesa da jornada de oito horas e elevação dos salários havia sido organizada por Paul Lafargue, genro de Karl Marx e um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores, em 1882. O evento, marcado para as 10h da manhã, era para ocorrer em uma atmosfera festiva e pacífica, com festejos à tarde terminando com um baile à noite.
Para mostrar sua oposição às reivindicações dos trabalhadores, os patrões mandaram fixar cartazes pela cidade afirmando sua determinação em não fazer concessões. O prefeito pediu reforços policiais que, armados com fuzis modernos, percorreram as ruas.
O confronto ocorreu no final da tarde quando cerca de 150 a 200 manifestantes chegaram à praça e enfrentaram 300 soldados que dispararam sobre a multidão. Em menos de um minuto, havia dez pessoas mortas e 35 feridos. Os mortos tinham entre 11 e 20 anos de idade. Entre eles, estava Marie Blondeau, de 18 anos, vestida de branco e levando um ramo de rosa mosqueta – ela se tornou o símbolo deste dia. É em sua honra que, na França, os manifestantes de 1º de Maio substituíram o triângulo vermelho pela rosa vermelha.
Meses depois do massacre de Fourmies, a Internacional Socialista de Bruxelas proclamou o 1º de Maio como dia internacional de reivindicações trabalhistas.
Por que foi escolhido o dia 1º de Maio?
Desde 1883-1884 discutia-se nos meios anarquistas franceses a ideia de greve geral de um dia que servisse de intimidação aos patrões em defesa da redução da jornada de trabalho e de melhores condições de trabalho.
Mas, por que a escolha recaiu sobre 1º de Maio e não sobre outro dia e outro mês?
Segundo a historiadora francesa Michelle Perrot, o 1º de Maio tem forte relação com as tradições populares em especial à Festa da Primavera, de origem pagã e vinculada aos ritos de fertilidade. Fim do inverno, época de renovação, de renascer da vida e esperança de um tempo novo são muito significativos para uma população, na maioria de origem rural, que anseia por uma vida melhor.
Nos Estados Unidos, o 1º de Maio vinculava-se à tradição norte-americana do Moving Day (Dia da Mudança), data em que muitas empresas começavam o seu exercício e quando se renovavam os aluguéis e os contratos de todo tipo. E “mudança” era o que queriam os trabalhadores.
A conquista da jornada de 8 horas diárias
Levou muito tempo para que os trabalhadores conquistassem a jornada de oito horas diárias. Antes dela, vieram outras conquistas, também importantes, como a regulamentação do trabalho infantil, a proibição do trabalho para crianças com menos de 8 ou 9 anos e o descanso semanal obrigatório.
A Inglaterra, país pioneiro da Revolução Industrial, fixou a jornada de 10 horas diárias em 1847, o que era um avanço pois os demais países europeus tinham jornadas de 12 a 14 horas diárias. Nos Estados Unidos, era de 11 a 13 horas diárias.
Até o início da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), contudo, a limitação da jornada diária em 10 horas havia se disseminado em quase toda Europa. Dois países pioneiros, Nova Zelândia e Estados Unidos, tinham, entretanto, adotado a jornada de 48 horas semanais no começo do século. O caso da Nova Zelândia explica-se pela pressão do movimento trabalhista australiano e a carência de trabalhadores qualificados.
Na América Latina, o Uruguai e o México adiantaram-se à tendência mundial. Em 1915, o governo do presidente José Batlle y Ordóñez, no Uruguai, implantou a jornada de 8 horas diárias. A Revolução Mexicana (1910-1920) produziu a Constituição de 1917 que, no artigo 123, estabelecia a jornada de 8 horas, além de garantir o direito de greve e proteção às mulheres e crianças.
A Rússia, quatro dias após a Revolução de Outubro (1917) fixou a jornada de 8 horas diárias, por um decreto do governo soviético. Em 1920, foi instituído o feriado de 1º de Maio.
O Tratado de Paz de Versalhes (28 de junho de 1919), institui a International Labour Office (hoje, Organização Internacional do Trabalho). Em sua primeira convenção, ainda em 1919, ela fixou no artigo 247 “a adoção da jornada de 8 horas ou semana de 48 horas como uma meta onde quer que ainda não tenha sido alcançada” para o setor manufatureiro
Naquele ano, 1919, por iniciativa de empresas ou por força de lei, muitos países adotaram a jornada de 8 horas diárias como foi o caso da França, Portugal, Espanha e Japão.
Em 1º de maio de 1926, a Ford Motor Company, nos Estados Unidos, tornava-se a primeira empresa do país a adotar a jornada de 40 horas semanais (5 dias na semana) para os operários de suas fábricas automotivas. Não demorou muito para que se instituísse pelo mundo afora o que se denominou “semana inglesa”: trabalho de segunda a sexta, e descanso no sábado e domingo.
Inclusão e manipulação do 1º de Maio
Celebrar oficialmente o 1º de Maio é reconhecer a luta secular dos trabalhadores que pagaram com sangue a conquista da jornada de oito horas. Essa lembrança, contudo, nem sempre interessou aos governos. A inclusão do 1º de Maio como feriado nacional em memória à luta trabalhista não foi tão comum como se imagina.
Os Estados Unidos e o Canadá se negaram a reconhecer o 1º de Maio e criaram outra data para o Labor Day que, desde 1894, é comemorado, como feriado nacional, na primeira segunda-feira de setembro. O 1º de Maio é celebrado somente pelos sindicatos, partidos e organizações de esquerda.
Na Itália, governo fascista, tratou de esvaziar a celebração do 1º de Maio substituindo-o pela Festa do Trabalho Italiano, comemorado no dia 21 de abril, data da fundação de Roma. Após o fim da guerra, em 1945, o 1º de Maio foi restaurado mas manteve a denominação Festa del Lavoro. Na França, também tem esse nome: Fête du Travail, desde 1919.
Na Alemanha, em 1933, o governo nazista de Hitler adotou a cor vermelha da bandeira dos trabalhadores e converteu o 1º de Maio em Dia Oficial do Trabalho celebrando o trabalho humano na sua acepção genérica e neutralizando suas relações com o proletariado.
Na Polônia, mais recentemente, o 1º de Maio ganhou um nome ainda mais neutro – Dia do Descanso, uma maneira de apagar da memória nacional as atividades oficiais realizadas pelo governo comunista.
No Brasil, onde as manifestações e greves operárias ocorriam desde 1892, o 1º de Maio foi oficializado como feriado nacional em 1925, no contexto político de estado de sítio do governo de Arthur Bernardes.
Durante o governo de Getúlio Vargas (1930-1945), as comemorações do 1º de Maio tornaram-se oficiais e ocasião para a divulgação das leis trabalhistas como foi a implantação da jornada de 8 horas diárias (em 1932, confirmada na Constituição de 1937 e na CLT de 1943). No Estado Novo, o 1º de Maio tornou-se a festa de exaltação de Getúlio Vargas, exaltado do “pai dos trabalhadores”, o benfeitor do país que concedeu as leis trabalhistas.
Fonte
- SANGHEON, Lee. Duração do trabalho em todo o mundo: tendências de jornadas de trabalho, legislação e políticas numa perspectiva global comparada. Secretaria Internacional de Trabalho. Brasília: OIT, 2009 (PDF)
- HOBSBAWN, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
- PERROT, Michelle. O Primeiro de Maio na França (1890): nascimento de um rito operário. In: Os excluídos da História: operários, mulheres e prisioneiros. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
- SÃO PAULO (cidade). 1890-1990: cem vezes Primeiro de Maio. São Paulo: Departamento do Patrimônio Histórico/Secretaria Municipal de Cultura, 1990.
- MARCHAND, Patrice. Journée de 8 heures et Fête du Travail. La CGT, 30 abr 2014.
- Tragédies et joies du 1er. Mai. Journée de 8 heures et Fête du Travail. Herodote.net, 29 abr 2016.
Saiba mais
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Boa tarde. Tenho imensa admiração por suas produções e analises históricas.
Sempre que possível, realizo atividades inversas com meu alunos e a minha referência são as suas publicações, sejam elas virtuais ou em livro físico.