A Revolução Russa de 1917 eclodiu em março de 1917 (no calendário ocidental), derrubou Nicolau II do poder, o último czar a governar a Rússia, e implantou um governo provisório republicano de cunho liberal.
O czar Nicolau II foi viver com sua família, a czarina Alexandra e seus cinco filhos, no palácio de Alexandre, em Tsarskoe Selo, a 24 km ao sul da capital czarista, Petrogrado (atual São Petersburgo). Ali era o centro de veraneio da nobreza russa onde havia um conjunto de palácios e parques erguidos a partir do czar Pedro I, no século XVIII.
A família do czar foi colocada sob prisão domiciliar pelo governo provisório e vigiada por soldados armados.
O rei britânico George V, primo materno de Nicolau II, ofereceu asilo ao czar na Grã-Bretanha, mas teve que se recuar o convite devido à pressão do parlamento que temia problemas com a presença da família do czar no país. Nicolau II e sua esposa nunca expressaram abertamente o desejo de ir para o exílio.
O cativeiro em Tobolsk
Com a crescente radicalização da revolução, Kerensky, o chefe do governo, mandou deportar os Romanov e sua comitiva para Tobolsk, na Sibéria (13 de agosto de 1917), o tradicional local de exílio dos adversários políticos do czarismo. Ali foram alojados na mansão do ex-governador com considerável comodidade.
A queda do governo de Kerensky e a tomada de poder pelos bolcheviques (7 de novembro de 1917) deteriorou a situação da família imperial que passou a ter cada vez menos liberdade.
Originalmente, os bolcheviques planejavam levar Nicolau II para ser julgado por seus crimes contra o povo russo em um grande tribunal popular, semelhante ao que ocorrera com rei Luís XIV, na Revolução Francesa. O julgamento estava programado para acontecer em Moscou, a nova capital da Rússia Soviética.
O cativeiro em Ekaterimburgo
Um comissário soviético foi encarregado de transferir Nicolau e toda família para Moscou, em abril de 1918. O grupo viajou via Ekaterimburgo. A viagem foi difícil e demorada devido a incapacidade de transportar o herdeiro do trono, o jovem Alexei, de 14 anos de idade, que sofria de hemofilia.
Decidiu-se, então, dividir a família: Nicolau, esposa e a filha Maria seguiram viagem e os demais permaneceram em Tobolsk até que Alexei melhorasse seu estado de saúde e pudesse viajar.
Os Romanov chegaram a Ekaterimburgo em 30 de abril. Na estação, foram recebidos com insultos por uma multidão furiosa. Seguiram para a casa do engenheiro Ipatiev, onde ficaram alojados. Foi erguido um tapume de madeira de quase 2 metros de altura ao redor da propriedade, e instaladas metralhadoras no telhado.
Nesta casa prevaleceu um regime restrito e humilhante para os Romanov. Nenhuma saída era-lhes permitida, e apenas curtos passeios no pequeno jardim da casa. Posteriormente, até as janelas foram fechadas para que os detidos ficassem completamente isolados.
Em 23 de maio chegou o restante da família e dos servos em Ekaterimburgo e dali foram transferidos para a Casa Ipatiev.
A execução da família
No início de julho, os exércitos brancos contrarrevolucionários se aproximaram de Ekaterimburgo. A sorte da família imperial foi, então selada: para não ser resgatada pelo Exército Branco, toda família deveria ser executada.
Na noite de 16 para 17 de julho de 1918, a família foi acordada e levada para o porão da casa em uma sala especialmente preparada. A czarina pediu duas cadeiras nas quais ela e seu filho doente Alexei sentaram. Todos foram alinhados em duas linhas, supostamente para uma foto que Moscou exigia para comprovar de que não haviam fugido. Em seguida foi dada a ordem de abrir fogo.
Nicolau, a czarina e Alexei morreram imediatamente, e as filhas ficaram gravemente feridas. Para terminar a execução, os atiradores esfaquearam as jovens com as baionetas. As armas, no entanto, permaneceram presas nos corpetes das meninas: descobriu-se que eles estavam recheados com as joias que serviram como escudo.
A execução durou uns vinte minutos até que o último estivesse morto. Foram mortos, também, os criados que escolheram acompanhá-los no exílio.
Outros membros da dinastia foram eliminados posteriormente totalizando 18 membros da dinastia além de outras pessoas, nobres e criados, que viviam ao redor dos Romanov.
Encobrindo os vestígios do crime
Os onze corpos foram levados para uma mina de carvão a cerca de 15 km de Ekaterimburgo. Os cadáveres foram despidos e jogados em um poço, e as roupas queimadas.
No dia seguinte, os corpos foram retirados do poço e levados para outro local para serem enterrados em uma vala comum. Derramou-se ácido sulfúrico sobre seus rostos para torná-los irreconhecíveis. Dois deles, Alexei e uma das irmãs foram enterrados afastados, cerca de 50 metros, para confundir quem, por ventura, descobrisse a vala com nove corpos. O buraco foi fechado com escombros e troncos de árvores.
O local disfarçado parecia desaparecido para sempre.
Em 20 de julho de 1918, foi publicado o anúncio oficial da morte de Nicolau II. A liderança soviética ocultou a execução de toda família. Alegou-se que a czarina e seus cinco filhos haviam sido levados para um lugar seguro. Com os anos, o desaparecimento da família imperial deu origem a vários rumores.
Os bolcheviques abandonaram a cidade de Ekaterimburgo em 25 de julho de 1918 e, logo seguir, ela foi capturada pelas tropas do Exército Branco. Os “brancos” inspecionaram a casa de Ipatiev, onde encontraram vestígios do crime. Nikolai Sokolov inspecionou meticulosamente o lugar e interrogou muitas pessoas.
À procura da verdade
Nikolai Sokolov fugiu para Paris onde reuniu evidências e testemunhos da execução. Concluiu que toda família imperial fora executada e depois queimada. Suas conclusões foram publicadas em 1925 e reacenderam os debates em toda Europa. Faltava, contudo, a prova principal: os corpos.
A Casa Ipatiev, que se tornara local de peregrinação de monarquistas russos, foi demolida em julho de 1977 por ordem de Boris Yeltsin quando secretário do Soviete regional.
Por essa época, o geólogo Alexander Awdonin e o cineasta Geli Ryabov interessaram-se pelo caso e decidiram procurar os vestígios da família do czar. Em maio 1979, tomando como pista uma foto publicada no livro de Sokolov, eles chegaram ao túmulo dos assassinados. Contudo, mantiveram segredo de sua descoberta até o colapso do comunismo.
Em 1989, após o desmoronamento do bloco soviético, Geli Ryabov publicou sua descoberta. Somente em 12 de julho de 1991, com a dissolução final da União Soviética, os restos mortais foram exumados.
Na sepultura foram encontrados nove dos onze membros da família do czar. Através de análises de DNA os restos foram identificados. Os outros dois cadáveres só foram encontrados em 2007.
A reabilitação dos Romanov
Oitenta anos após o assassinato do czar e sua família, os restos mortais da família do czar foram sepultados com honras de Estado na Capela Santa Catarina, na Catedral de São Pedro e São Paulo, em São Petersburgo, onde se encontra a maioria dos outros monarcas russos desde Pedro, o Grande.
Em 15 de agosto de 2000, a igreja Ortodoxa Russa anunciou a canonização da família por sua “humildade, paciência e mansidão”. No local do assassinato, em Ekaterimburgo, foi erguida a Igreja do Sangue Derramado, em 2002/2003.
Em 1 de outubro de 2008, a Suprema Corte da Rússia reconheceu que Nicolau II e sua família foram vítimas de repressão política e os reabilitou.
Resta comprovar quem foram os responsáveis pela ordem de execução dos Romanaov. Tradicionalmente, são apontados Lenin e Sverdlov, mas até o momento não há documento confiável que prove que a iniciativa partiu desses líderes.
Fonte
- MASSIE, Robert K. Os Romanov, o fim da dinastia. Rio de Janeiro: Rocco, 2017.
- FERRO, Marc. A verdade sobre a tragédia dos Romanov. Rio de Janeiro: Record, 2017
Saiba mais
- Início da segunda fase da Revolução Russa
- Guerra Civil Russa, 1918-1920: a trágica implantação do comunismo
- Assassinato de Leon Trótski, no México