Em 5 de dezembro de 1967, foi criada a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), renomeada Fundação dos Povos Indígenas, em 2023, organização governamental brasileira para a promoção e proteção dos indígenas do país.
Inicialmente vinculada ao Ministério do Interior (hoje extinto), depois ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, passou para o Ministério da Justiça e Segurança Pública e atualmente a Funai está ligada ao Ministério dos Povos Indígenas, criado em 2023 e presidido pela ativista Sônia Guajajara.
A Funai é presidida pela advogada Joênia Wapichana (ou Uapixana), primeira mulher indígena a ser eleita deputada federal na história do Brasil. No dia seguinte à sua nomeação, Joênia Wapichana anunciou sua intenção de retomar as demarcações de terras indígenas que haviam sido paralisadas no governo anterior, como são os casos:
- Terra Indígena Jeju e Areal (Pará),
- Terra Indígena Tekoha Porã (São Paulo),
- Terra Indígena Karugwá e Pyhaú (São Paulo),
- Terra Indígena Ka’aguy Poty (Rio Grande do Sul),
- Terra Indígena Cambirela (Santa Catarina),
- Terra Indígena Passo Piraju/Nu Porã (Mato Grosso do Sul),
- Terra indígena Aranã Índio (Minas Gerais),
- Terra Indígena Aranã Caboclo (Minas Gerais)
- Terra Indígena Mukurin (Minas Gerais)
- Terra Indígena Cassupá e Salamãi (Rondônia)
Em 2023, foram homologadas mais 3 terras indígenas:
- Potiguara de Monte-Mor (PB): povo Potiguara
- Morro dos Cavalos (SC): povos Guarani Mbya e Nhandeva
- Toldo Imbu (SC): povo Kaingang
A Funai formou uma força tarefa para lidar com a crise humanitária envolvendo o povo Yanomami que desde o governo anterior de Jair Bolsonaro (2019-2023) vinha sofrendo mortes em massa, fome, deslocamentos forçados e outras violações dos direitos humanos. Tais eventos teriam começado ou se agravado a partir de 2019 como consequência da exploração desenfreada de recursos naturais por indivíduos e empresas e negligência do governo.
A missão da Funai é garantir o cumprimento da política indigenista o que inclui o respeito às comunidades tribais, e a garantia de posse permanente das terras que habitam e usufruto exclusivo de seus recursos naturais.
São também atribuições da Funai gerir o patrimônio indígena (identificar, delimitar, demarcar, regularizar e registrar as terras ocupadas pelas nações indígenas), prestar assistência médico-sanitária aos índios, garantir o direito à educação escolar indígena, e exercitar o poder de polícia nas áreas reservadas e na proteção do índio.
Política Indigenista brasileira: SPI
Em 1910, foi criado o “Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais” (SPILTN), vinculado ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, e denominado, em 1918, “Serviço de Proteção aos Índios” (SPI).
O SPI foi a primeira organização criada para proteger os nativos que passaram, a partir de então, a serem tutelados pelo Estado brasileiro, e não mais de instituições religiosas como ocorria desde o período colonial. O objetivo principal do SPI era integrar os povos indígenas sociedade nacional.
A criação do SPI ocorreu em um contexto geopolítico marcado por uma crise da agricultura pós-abolição, pela eclosão de movimentos populares rurais (Canudos, Contestado e cangaço), pela exploração da borracha na Amazônia e pela definição de fronteira, entre as quais Acre, Roraima e Amapá – situações que de alguma forma afetaram povos indígenas ou deram destaque à sua própria existência, distante e isolada dos grandes centros urbanos.
O isolamento de grandes áreas, especialmente regiões fronteiriças no Oeste, levou o governo a implementar um programa de expansão de linhas telegráficas. O país possuía à época da proclamação da República, cerca de 19 mil km de linhas de telégrafo, porém Mato Grosso, Goiás e Amazonas estavam fora desse circuito.
Coube ao tenente-coronel Cândido Rondon o trabalho de construção de linhas telegráficas naqueles estados implantando, entre 1890 e 1910, mais de 5 mil km de cabos de telégrafo nas florestas brasileiras, além de mapear rios e montanhas até então desconhecidos pelos cartógrafos, e de estabelecer relações cordiais com diversos povos indígenas.
Por sua experiência, Rondon foi convidado a dirigir o SPI, cargo que ocupou até 1930. A intenção do Serviço era transformar os índios em pequenos produtores rurais capazes de se autossustentarem.
O governo de Getúlio Vargas preocupado com a “nacionalização dos silvícolas”, transferiu o SPI para o Ministério da Guerra e deu-lhe outra missão: transformar o índio em guarda de fronteira. O Regulamento aprovado pelo decreto no. 736, de 6 de abril de 1936, estabelecia, entre outras coisas, que o SPI deveria cuidar para integrar o índio por meio de um ensino agrícola, moral e cívico com destaque do culto à bandeira e de noções de história do Brasil.
No início da década de 1960, o SPI foi investigado por uma comissão parlamentar de inquérito devido a denúncias de corrupção, genocídio, abusos e ineficiência. A investigação resultou no Relatório Figueiredo, produzido em 1967 pelo procurador Jader de Figueiredo. Ele descreve violências praticadas por latifundiários e funcionários do SPI contra índios ao longo das décadas de 1940 a 1960. Documenta crimes de genocídio contra os povos indígena, incluindo assassinatos em massa, tortura e guerra bacteriológica e química, escravidão e abuso sexual.
Como resultado do relatório, funcionários do SPI foram demitidos e a organização foi extinta em 1967, sendo substituída pela Funai.
Fundação Nacional do Índio
A criação da Funai era parte do projeto do regime militar (1964-1985) de expansão político-econômica para o interior do País, sobretudo para a região amazônica. Neste sentido, a Funai e as políticas indigenistas estavam subordinadas aos planos de defesa nacional, construção de estradas e hidrelétricas, expansão de fazendas e extração de minérios.
A ação da Funai durante a ditadura foi fortemente marcada pela perspectiva de assimilação e integração do índio conforme afirmado pelo Estatuto do Índio (Lei nº 6.001), aprovado em 1973 e ainda vigente. O estatuto considera os povos indígenas como “relativamente incapazes”, sendo tutelados pela Funai até sua integração na sociedade nacional.
A Constituição de 1988 deu um novo tratamento aos povos indígenas reconhecendo seu direito à diferença (Art.231), sua identidade cultural própria e diferenciada, assegurando-lhes o direito de permanecerem como índios e o usufruto exclusivo das terras que tradicionalmente ocupam, definidos a partir de seus usos, costumes e tradições (Art. 231).
O Artigo 232, reconhece os indígenas e suas organizações como partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos, o que incentivou a expansão e a consolidação de suas associações.
Por essas disposições constitucionais perderam a validade o conceito de “capacidade relativa dos silvícolas” (Código Civil, 1917) e a necessidade do “poder de tutela.
Diante desta mudança, tornou-se necessária a revisão do Estatuto do Índio (1973) cujo projeto está paralisado desde 1994.
Em 1991, quatro decretos presidenciais (ns. 23, 24, 25 e 26 de 4 de fevereiro de 1991) transferiram funções da Funai para outros ministérios e órgãos federais. Deixaram de ser responsabilidade da Funai: a prestação de assistência à saúde das populações indígenas, proteção ao meio ambiente em terras indígenas, garantir a autossustentação dos povos indígenas e ações referentes à educação indígena.
Fonte
- Lei No.5.371, de 5 de dezembro de 1967. Presidência da República, Casa Civil
- Fundação Nacional do Índio. FUNAI. Página oficial.
- Órgão indigenista oficial. Povos Indígenas no Brasil.
- Política indigenista do século XVI ao XX. IBGE. Brasil 500 anos.
- Relatório ‘perdido’ expõe genocídio de índios brasileiros. Survival International. 25 abr 2013.
- Relatório Figueiredo revela que famílias tradicionais se apossaram de terras indígenas no MS. Instituto Humanitas Unisinos. 13 jun 2013.
- LIMA, Antônio Carlos de Souza. O governo dos índios sob a gestão do SPI. In: CUNHA , Manuela Carneiro da (org.). História dos Índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, Secretaria Municipal de Cultura, Fapesp, 2009.
- CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). Os Direitos do Índio: ensaios e documentos. São Paulo: Brasiliense, 1987.