Em 5 de outubro de 1897, chegava ao fim a Guerra de Canudos, no sertão da Bahia, depois de quatro campanhas militares enviadas entre 1896 e 1897. As forças do Exército, compostas por cerca de 10 mil homens e comandadas por dois generais, cercaram, invadiram e destruíram a povoação de Belo Monte, também conhecida como Canudos. Foi um dos conflitos mais sangrentos da História do Brasil.
O episódio final foi acompanhado por Euclides da Cunha, que registrou suas impressões em um livro que se tornou obra-prima da literatura brasileira: “Os Sertões” (1902).
O conflito de Canudos mobilizou aproximadamente 12 mil soldados oriundos de dezessete estados brasileiros, distribuídos em quatro expedições militares. Em 1897, na quarta incursão, os militares incendiaram o arraial, mataram grande parte da população e degolaram centenas de prisioneiros. Estima-se que morreram ao todo por volta de 20 mil pessoas, culminando com a destruição total da povoação.
Canudos: contexto histórico
No final do século XIX, cerca de 64% da população brasileira vivia na zona rural. A proclamação da República (1889) não trouxe benefícios para a maioria dessas pessoas. Destituídos de bens, continuavam na miséria, explorados pelos grandes proprietários, sofrendo as agruras das secas cíclicas, o desemprego crônico e sem qualquer assistência do governo.
Nas áreas rurais, os ex-escravos misturavam-se à população pobre, constituindo a vasta população de caipiras, sertanejos e caboclos. Essa população vagava pelos sertões, estabelecendo-se por curto tempo em fazendas para cultivar uma pequena roça de subsistência. Depois, voltava a perambular.
Surge Antônio Conselheiro e Belo Monte
Por volta de 1871, o cearense Antônio Vicente Mendes Maciel, apelidado de “Antônio Conselheiro“, começou a pregar pelo sertão do Ceará, Pernambuco, Bahia, Alagoas e Sergipe. Como fora educado para ser padre, sabia ler e escrever. Levava uma vida modesta e muito religiosa. Além de pregar, trabalhava construindo e reformando igrejas, cemitérios, casas e açudes. Em pouco tempo, adquiriu a fama de homem santo e reuniu centenas de fiéis, impressionados com suas palavras e sua conduta piedosa.
Em 1893, Antônio Conselheiro decidiu fixar-se na região de Canudos, na Bahia. Ali fundou a cidade de Belo Monte. O nome da cidade acabou se confundindo com o da região, e ambos – Belo Monte e Canudos – passaram a indicar a mesma localidade.
A vida em Belo Monte / Canudos
Antonio Conselheiro atraiu milhares de pessoas para Canudos esperançosos de uma salvação milagrosa que as livrariam da fome, da miséria, dos flagelos do clima e da exclusão econômica e social. Em pouco tempo, o arraial chegou a ter carca de 25 mil habitantes.
Os moradores levavam uma vida simples, mas sem miséria e fome: plantavam milho, feijão, mandioca, batata e cana de açúcar; criavam cabras para ordenha, carne e couro. Cada família entregava um terço do que produzia para o sustento da comunidade.
Os poderosos ameaçados
A concentração de sertanejos preocupou os grandes fazendeiros da região pela perda de mão de obra barata e diminuição de seus “currais eleitorais”. As autoridades religiosas também temiam o prestígio popular de Antônio Conselheiro e concordavam que era preciso acabar com o movimento de fiéis à sua volta.
Os jornais divulgavam que Canudos era povoada por fanáticos perigosos e que Conselheiro era monarquista e, portanto, uma ameaça à República. Isso porque, em suas pregações, ele criticava o casamento civil e a cobrança de certos impostos, chegando a queimar ordens de cobrança fiscal.
Logo espalharam-se rumores que Canudos se armava para atacar cidades vizinhas e partir em direção à capital para depor o governo republicano e reinstalar a Monarquia.
Teve início, então, um forte grupo de pressão junto ao governo, pedindo que fossem tomadas providências contra Antônio Conselheiro e seus seguidores.
A guerra de Canudos
Mesmo sem nenhuma prova destes rumores, o Exército foi mandado para Canudos. De novembro de 1896 a outubro de 1897, três expedições militares, cada vez maiores e mais armadas, investiram contra Canudos e foram derrotadas.
Os sertanejos resistiram usando armadilhas, técnicas de camuflagem, abrindo túneis para ataque e fuga, e adotando táticas de guerrilha para surpreender os soldados.
A quarta (e última) expedição militar reuniu cerca de 10 mil soldados armados com fuzis e canhões: o Whitworth 32, de 105 milímetros, apelidado de “a matadeira”, e o canhão Krupp, de 60 milímetros, usado na Guerra do Paraguai.
Em setembro de 1897, Canudos foi cercada e bombardeada. A cidade resistiu ainda durante doze dias até ser inteiramente arrasada, em 5 de outubro de 1897 quando morreram seus quatro últimos defensores. Muitos prisioneiros de guerra foram degolados, e todas as casas do arraial, incendiadas. Calcula-se que, no total, morreram em torno de 20 mil pessoas. Foi um dos mais sangrentos conflitos armados do Brasil.
Fonte
- COIN, Cristina. A Guerra de Canudos. São Paulo: Scipione, 1992. (Coleção História em Aberto)
- MONIZ, Edmundo. Canudos: a luta pela terra. São Paulo: Global, 1982. (Coleção História Popular).
- ______. A Guerra Social de Canudos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
- VILLA, Marco Antonio. Canudos, o campo em chamas. São Paulo: Brasiliense, 1992. (Coleção Tudo é História).
- MONTEIRO, Hamilton de M. Nordeste insurgente (1850-1890). São Paulo: Brasiliense, 1981. (Coleção Tudo é História).
- QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. O messianismo como missão: tensões sociais e criação cultural na Primeira República. São Paulo: Alfa-Omega, 1977.
- Canudos. Acervo “O Estado de S. Paulo”.